14 maio 2013

O poder dos cinco sentidos (2)



As maneiras que usamos para deliciar nossos sentidos variam de cultura para cultura. Nossos sentidos transpõem o tempo. Eles nos ligam intimamente ao passado com mais intensidade do que nossas ideias. Vivemos atados por nossos sentidos. Ao mesmo tempo em que nos fazem crescer, eles nos limitam e cerceiam. Temos a necessidade de criar obras de arte para aprimorar nossos sentidos e aumentar as sensações do mundo que nos cerca, para que nós possamos deliciar mais com os espetáculos da vida. Vamos comentar neste segundo artigo de dois importantes sentidos para nossas vidas: a visão e o olfato. O primeiro torna-se mais densamente mais rico quando o percebemos com os olhos, e o poder do olfato sempre foi assunto de povos de todas as culturas. 


Vamos começar pelos olhos. Os olhos continuam sendo os grandes monopolizadores de nossos sentidos. Cerca de 70% dos receptores dos sentidos do corpo humano estão localizados nos olhos, e é principalmente por meio da visão do mundo que o podemos julgar e entender. Nossa linguagem está baseada nas imagens. Sem a luz e sem a água a vida existiria? A luz afeta nossos estados de espírito, acelera os hormônios, detona nosso ritmo. Durante as estações em que prevalece a escuridão nas latitudes do norte, aumentam os índices de suicídios, a insanidade surge em vários lares e o alcoolismo torna-se uma constante. Uma característica de nossa espécie é a habilidade de adaptarmo-nos ao ambiente e também de mudá-lo para servir-nos melhor. Quando queremos iluminar o mundo em torno de nós, construímos lâmpadas. Nossas pupilas aumentam naturalmente quando estamos entusiasmados ou excitados.

Há muitas maneiras de ver. O esforço para enxergar projeta uma visão diferente de tudo e de todos. Às vezes as sombras desenham imagens que distorcem a verdade das coisas e das pessoas. E também a visão direta da claridade, sem acostumar os olhos, cegava. Para enxergar bem, é preciso olhar profundamente e isso faz descobrir novas formas e significados e até mesmo outras visões. Os olhos que tudo vêem, não vêm a si mesmos, têm que se adaptar ao desejo de quem olha.

Já os odores detonam suavemente nossas memórias. Basta percebemos um aroma, e as lembranças explodem todas imediatamente. O olfato é o sentido mudo, o que não tem palavras. Vemos somente quando existe luz suficiente, degustamos o paladar quando colocamos coisas na boca, sentimos apenas quando tocamos alguém ou alguma coisa, ouvimos somente quando os sons são audíveis. Mas cheiramos o tempo inteiro, sempre que respiramos. Se cobrirmos os olhos, deixaremos de ver, se taparmos as orelhas, deixaremos de ouvir, mas se bloquearmos o nariz para não sentir mais cheiros, morremos. “Quem dominasse os odores dominaria oi coração das pessoas”, escreveu Patrick Suskind no romance O Perfume.

O olfato está intimamente ligado às emoções, à memória, além de influenciar seu bem-estar, sua imaginação e personalidade. O olfato tem ligação com nosso subconsciente. Os nervos olfativos se ligam com a gente do cérebro que regula a atividade sensório-motora, o sistema límbico. Esta região cerebral é responsável pelos impulsos primitivos de sexo, fome e sede e afeta diretamente o comportamento emocional.

Os cheiros compõem um alfabeto e linguagem particular que têm o poder de provocar reações específicas no corpo e na psique. Assim atingem os mais profundos cantinhos da alma, muitas vezes desconhecidos. Muitos artistas procuram sensações olfativas para estimular a criatividade. Segundo Jean Jacques Rousseau o sentido do olfato é a própria imaginação. O aroma de um pedaço de bolo e uma xícara de chá inspiraram Marcel Proust a descrever, em uma das maiores obras primas da literatura, a recordação infantil de comer bolinhos chamados “madeleines”. O olfato é um sentido muitas vezes menosprezado pela cultura excessivamente visual da atualidade. Os cheiros envolvem-nos, giram ao nosso redor, entram em nossos corpos, emanam de nós. Vivemos em constante banho de odores. O olfato é o mais direto de nossos sentidos. Cada um de nós possui suas próprias memórias aromáticas. O olfato foi o primeiro de nossos sentidos a se desenvolver. Pensamos
porque cheiramos.

A cegueira não é empecilho para que o herói do gibi como Demolidor faça justiça. Quem é deveras cego? Pergunta José Saramago (Cia das Letras) no “Ensaio sobre a Cegueira”. Já João Vicente Ganzarolli de Oliveira (Revan) explicita como o belo é concebido pelo cego em “Do Essencial Invisível”. Em “O Perfume, História de um Assassino” (Record), Patrick Suskind busca a fórmula de um perfume ideal, num mundo descrito por odores, enquanto que o poeta Chales Baudelaire em vários poemas do “Flores do Mal”, traz a sinestesia, trabalha muito com o olfato. Isso sem falar na obra maior de Marcel Proust, “Em Buscas do Tempo Perdido”, no qual o odor de uma madeleine no chá traz à tona recordações de infância, inspirou pesquisadores ingleses a investigar a relação olfato-memória, que foi batizada de “proustian phenomena”. O terceiro e último desses artigos sobre sentidos vamos conhecer o tato, o paladar e a audição.


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