27 fevereiro 2008

O Amante de Lady Chatterley

Há 80 anos o escritor David Herbert Lawrence (1885/1930) com a obra O Amante de Lady Chatterley entrou para a história da literatura inglesa pela portado escândalo. O tema ousado (a relação extraconjugal de uma aristocrata com um empregado) e a descrição detalhada das cenas de sexo levaram o romance a ser banido – com direito à circulação de várias edições piratas antes da primeira publicação oficial na Inglaterra, em 1960.

Na imprensa, foi considerado “o livro mais sujo da literatura inglesa”. Só 32 anos depois sua publicação foi liberada no Reino Unido. Enquanto isso, circulou clandestinamente, em edições piratas ou publicadas em outros países. Hoje é considerado uma das obras seminais da literatura moderna, com sua ousada história de uma lady inglesa que busca a satisfação com o jardineiro de sua casa, depois que o marido fica impotente devido a um acidente na guerra. Na obra, Lawrence glorifica a alegria dos corpos durante o sexo, o que para ele é uma das leis eternas da natureza.

D.W.Lawrence, perseguido muitas vezes pela censura inglesa com a publicação de O Amante de Lady Chatterley, afirmou que os que atacam o erotismo não passam de hipócritas: “Metade dos grandes poemas, quadros, obras musicais e histórias deste mundo tem sua grandeza no apelo sexual. Em Ticiano ou Renoir, no Cântico de Salomão ou em Jane Eyre, em Mozart ou em Anne Laure, a beleza surge impregnada de apelo sexual...”. Lawrence aponta, enfim, para o grande problema moral do nosso tempo. O povo, moralizado, passou a ser a unidade de medida para definir o que é moral e imoral, erótico e pornográfico. Os moralistas se aproveitam disso como o axioma: vox populi, voz Dei. Perde-se assim o discernimento entre sentido massa e sentido individual; ou melhor, o indivíduo não pode mais exercer a sua capacidade de julgar: “o hábito-massa de condenar todas as formas de sexualidade é excessivamente forte para deixar que a tomemos como coisa natural”.

Lawrence pergunta: ao qualificar uma obra ou uma ação pornográfica, erótica ou obscena, estou tendo uma reação individual ou estou agindo conforme o senso comum (interrogação) É uma questão delicada quando se sabe que o erotismo está associado tanto ao imaginário individual quanto às atividades cerebrais: o espírito livre qualifica como sexuais objetos, seres e até mesmo momentos que em si nada têm de sexuais.

TERROR DO CORPO

O Amante de Lady Chatterley, o décimo e último romance de D.H.Lawrence, narra a história da esposa frustrada de um aristocrata arrogante e impotente, ferido na Primeira Guerra Mundial, e seu caso com um jardineiro de quem ela engravida e por quem abandona o marido, a casa e sua classe social. Apesar do tema adúltero, Lawrence estava convencido de ter escrito um livro afirmativo sobre o amor físico, que poderia ajudar a libertar a mente puritana do “terror do corpo”. Ele acreditava que séculos de ofuscação tinha deixado a mente “subdesenvolvida”, incapaz deter uma “reverência adequada pelo sexo e uma admiração apropriada da experiência estranha do corpo”. Dessa forma, criou com Connie Chatterley uma heroína que desperta sexualmente e ousa renovar a folha de parreira do ventre de seu amante para examinar o mistério da masculinidade.

Embora a exposição da fêmea nua fosse aceita havia muito tempo como prerrogativa de artistas e pornógrafos, o falo costumava ser obscurecido ou disfarçado com acrógrafo e jamais era revelado ereto. Mas a intenção de Lawrence era escrever um “romance fálico”, e com freqüência, no livro, lady Chatterley concentra sua atenção no pênis do amante, afaga-o com os dedos, acaricia-o com os seios, toca-o com os lábios, segura-o nas mãos e observa-o crescer, estende a mão para acariciar os testículos e sente seu estranho peso suave; e enquanto seu assombro era descrito por Lawrence, milhares de leitores do sexo masculino sentiam indiscutivelmente sua própria excitação sexual, imaginavam o prazer do toque frio de lady Chatterley em seus órgãos cálidos e tumescentes e experimentavam por meio da masturbação a emoção vicária de ser seu amante. O texto erótico muitas vezes leva à masturbação, e isso era motivo suficiente para tornar controverso o romance de Lawrence.

O livro foi rotulado de obsceno nos Estados Unidos durante 30 anos, mas em 1959, um juiz federal, influenciado pela nova definição de obscenidade da Suprema Corte, suspendeu a proibição do romance e admitiu que D.H.Lawrence, o autor do livro, era um homem de gênio. Lawrence terminou a versão final do romance em 1928. O editor recusou a publicar e Lawrence levou o manuscrito para Florença, onde, cm a ajuda de tipógrafos italianos que não entendiam uma palavra de inglês, produziu uma edição em capa dura limitada a mil exemplares. Os livros foram contrabandeados para a Inglaterra e distribuídos por meios de seus amigos a muitos leitores. A primeira edição esgotou-se rapidamente, e seguiu-se uma segunda impressão. Editores undergrounds fizeram cópias fac-similares e venderam-nas aos milhares. O livro só foi declarado legal nos EUA no verão de 1959.

Para além do escândalo, o romance de Lawrence permaneceu atual por trazer o ponto de vista da mulher para o primeiro plano (coisa rara na época) e por tocar francamente em questões consideradas tabus, como a sexualidade. O texto serviu de base para uma série de filmes e adaptações cinematográficas.

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