09 dezembro 2019

Sesquicentenário dos quadrinhos brasileiros (09)


Acompanhando o sucesso do Capitão Sete, surgiu outra personagem num horário diferente do vídeo, patrocinado pela fábrica de brinquedos Estrela. Era o Capitão Estrela. A fábrica de brinquedos Estrela resolveu investir num super-herói próprio, uma espécie de garoto-propaganda. Surgiu assim, na TV Tupi do Rio de Janeiro, num horário diferente, o Capitão Estrela. Veterano da Segunda Guerra, Capitão era um mutante (em uma época em que essa palavra não estava na moda) com força, inteligência e agilidade acima do normal. E tinha um parceiro juvenil, Menino Brazil (isso mesmo, com "z" ) que, apesar de vir de uma família de humildes sergipanos, era loiro e com olhos azuis. O Capitão era interpretado pelo gaúcho Dary Reis, enquanto que seu nemesis, o terrível Gargalhada Sinistra, ficava a cargo de Turíbio Ruiz. Assim como o Capitão 7, o novo personagem virou, além de televisivo, também um herói multimídia, chegando inclusive a ganhar seu próprio gibi em 1961, a revista Fantasia, editada pela mesma editora Continental do Capitão 7, inclusive com os mesmíssimos desenhistas (liderados por Jayme Cortez). 

O gibi do Capitão Estrela acabou não agradando o público leitor, e sua revista só durou oito números. Talvez o principal problema tenha sido a confusão visual. Por exemplo, na TV, embora em preto e branco, era evidente que o uniforme que Reis usava era branco. Só que nas capas dos gibis a roupa era vermelha. E seu parceiro nos quadrinhos era o garoto Joel. No final das contas, a dupla do gibi ficou mais parecida com Mr. Escarlate e Pinky do que com a versão da TV. Na época, as editoras como a Continental/Outubro tinham tomado uma decisão importante: só trabalhar com desenhistas brasileiros. Juarez Odilon, um dos desenhistas da casa, era quem capitaneava o gibi do Capitão Estrela. O herói tinha na testa e no peito, a famosa estrela de quatro pontas, logotipo da empresa Brinquedos Estrela, que já patrocinava uma série de programas ao vivo, pela televisão.




Em 1960, a pedido do editor de O Cruzeiro, Ziraldo criou Pererê, a primeira revista em quadrinho nacional de um único autor e toda colorida. A publicação foi um marco na trajetória das HQs no Brasil. Pererê circulou entre outubro de 1960 a abril de 1964, com uma tiragem média de 120 mil exemplares, e chegou a vender 150 mil, número muito expressivo para a época. Chegava às bancas nos primeiros dias de cada mês. A revista se identificava com a nossa cultura através das lendas, cenários, crendices e linguagem. As aventuras do personagem Pererê aconteciam na Mata do Fundão, e seus amigos eram pessoas e bichos. Em meados de 1975, Ziraldo relançou os quadrinhos com as histórias do Pererê e sua turma. Publicada pela Editora Abril e teve apenas dez edições. Nos anos de 1985 e 1991, as histórias foram republicadas, pela mesma editora, em forma de almanaque. A partir daí são publicadas álbuns e edições especiais das editoras Primor, Nova Didática, Salamandra e Globo. Revista criada em 1960 e durou até 1964. Lançada através da Empresa O Cruzeiro. Foi o melhor exemplo de brasilidade que temos nos quadrinhos. Em 1975 a série voltou através da Editora Abril. Durante 43 números e 182 histórias, a alegre fauna ziraldiana que representou no microcosmo da Fazenda do Fundão o clima de euforia nacionalista então vigente no país.




O personagem surgiu no embalo da bossa nova, do Cinema Novo e do rock´n´roll, deixando sua marca como um surpreendente libelo ecológico. Nos argumentos, a ambientação rural e simplória determinava a distancia segura para reproduzir a ebulição política da época. Com desenhos estilizados, onomatopéias multicoloridas e coleções de neologismos tropicalistas nos diálogos, as molecagens dos personagens chegaram a atrair 150 mil fiéis compradores por edição. Uma estranha coincidência cronológica cancelou o gibi em abril de 1964, o mês do golpe militar. A abertura promovida pelo governo Geisel inspirou o renascimento do Pererê, em formatinho, em julho de 1975. Os roteiros tornaram-se menos politizados, mas faltava à revista uma definição pelo público infantil (como sugeria sua arte) ou adulto (como queriam as entrelinhas). Problemas: a versão não completou o primeiro ano de vida. Os bons resultados obtidos pelo Menino Maluquinho, herdeiro quadrinizado do best seller literário homônimo, deram o impulso que o novo projeto exigia. O Almanaque do Pererê (   ) fez sua opção pelas crianças.




Entre 1965 e 1969 Ziraldo publicou Jeremias, o Bom nas páginas do Jornal do Brasil, seguindo para a revista O Cruzeiro logo depois. Foi publicado também no Sol, Pasquim, nas revistas Manchete e FairPlay, entre outras. Ele já assinava uma página dominical de cartuns no jornal, abordando temas diversos do Brasil, “faltava um personagem. Como o Amigo da Onça, que era um malandro, fazia sucesso, resolvi criar um anti-Amigo da Onça”, conta Ziraldo, referindo-se à criação de Péricles Maranhão, celebrizada nas páginas daquela mesma revista. Um personagem inteligente, gentil e elegante, que se sacrifica sem titubear. Já perdeu as contas de quantas vezes doou seu coração, que sempre nasce de novo por ele ser só coração. No início o personagem fazia crítica de costumes, depois “aderiu” à política durante as cerca de 20 semanas em que foi publicado, segundo Ziraldo, sem que os editores de O Cruzeiro notassem as críticas ao regime militar. Essa militância de Jeremias acabou com adesão do cartunista da revista.



O personagem de Ziraldo é o símbolo de uma brasilidade esquecida, simboliza o bem, a gentileza e a cortesia esquecidos nas delegacias, nos porões de tortura e nos ambientes profissionais. Um clássico do humor gráfico. Passando da crônica de costumes aos temas políticos, ele vive muitas situações, sempre mostrando porque é conhecido como o Bom. Não "o bom" de espertalhão, aproveitador, mas o bom solidário, prestativo, amigo, enfrentando tudo com uma abnegação silenciosa e rendendo-se mudo à sina de ajudar parentes, colegas de trabalho e desconhecidos. “O Jeremias é tão bom que pode ajudar as novas gerações a ir descobrindo o Brasil", afirmou seu criador.




Capitão Cipó é uma criação do cartunista carioca Daniel Azulay para o Correio da Manhã, na sua melhor fase, e marcaram época, a partir de 1968. Por outro lado, Cipó era uma figura curiosíssima: de comportamento tropicalista, sofria de misoginia (fobia às mulheres) e andava quase sempre envolto num cinto onde havia de tudo, desde esparadrapos até pílulas anticoncepcionais. A crítica aplaudiu. Fruto da psicodelia e da liberação sexual, Capitão Cipó estreou em 11 de janeiro de 1968 no jornal carioca Correio da Manhã e circulou até 15 de março de 1969 em tiras diárias. Influenciado pelos quadrinhos adultos que se expandiam pela Europa, o Capitão é criação do cartunista Daniel Azulay. Era um super anti super-herói, criticando simultaneamente os valores tradicionais das HQs e os valores novo-rio-arrivistas das calçadas de Ipanema.




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