A obra é densa, envolve terror, questões
psicológicas em um clima de faroeste. O local é uma cidade do interior da
Paraíba chamada Três Buracos. Três coisas a mantém viva: o garimpo, o puteiro e
o cemitério. Esse é o foco da mais nova obra do desenhista Shiko lançado
recentemente pela Editora Mino: Três Buracos
E é nessa terra perdida que um delegado
tenta manter as leis e a sanidade geral punindo severamente quem pega o que não
é seu, especialmente aquilo que está destinado ao patrão. Um dia o delegado cai
nas graças do desejo quando encontra uma das maiores turmalinas, porém ele se
nega a entregar ao patrão e a esconde para nunca ser encontrada. Esta atitude o
sentencia a morte. A cidade parece viver uma maldição pelo afastamento do único
capaz de ditar as regras e sua filha Tânia, é a única que permanece no garimpo
durante os anos.
“Quando o pai da Tânia é morto, o garimpo
acaba, o irmão dela vai embora e vira um ladrão. Ela não consegue sair de Três
Buracos por ser assombrada pelo espírito do pai. É uma história de botija, um
mito sertanejo de tesouro escondido. O tesouro tá enterrado, escondido, e a
alma da pessoa que escondeu não consegue partir, fica presa na terra até que
alguém desenterre esse tesouro. Aí essa filha é assombrada pelo espírito do pai
e não consegue abandonar esse lugar”, revela Shiko.
O artista Shiko transparece em cada página
com críticas da vida nordestina e do garimpo misturadas com um faroeste
tupiniquim onde a lei do mais forte sobrevive. E isso não apenas fisicamente,
mas mentalmente também. Aqui, nada caminha a exatidão e felicidade, sobra
apenas a realidade dura e dolorida.
Em certos momentos a ausência de textos
fortalece a construção dos traços. O preto e branco é um definitivo para o
clima do vazio e da perda de esperança dos personagens presos em seus buracos
perdidos.
A narrativa é um faroeste com enforcamento,
garimpo e assalto a banco. No sertão nordestino é comum o assalto a caixas
eletrônicos e essa obra fica entre o faroeste e o terror com um ambiente
contemporâneo. Os enquadramentos horizontais lembram a fotografia do cinema
italiano de faroeste.
Realidade e sonho se misturam para contar essa história na
qual as almas estão sempre entre a salvação e o Inferno. Três Buracos é
contemplada ainda pelo forró de Luiz Gonzaga, com Buraco de Tatu, e a cantiga
medieval de Pedro Calderón de la Barca, com trecho da peça A Vida é Sonho, para
embalar as almas – vivas ou mortas – que buscam a salvação para fugir do
inferno.
O quadrinista Shiko tem obras importantes
como a adaptação de O Quinze e as graphic novels O Azul Indiferente do Céu, Talvez
seja mentira, Lavagem e Piteco – Ingá. Seus temas recorrentes giram em torno de
fantasia, erotismo, folclore, solidão e cultura popular. Em 2014 ganhou o 26º
Troféu HQ Mix de melhor desenhista nacional e melhor publicação de
aventura/terror/ficção. Também ganhou o 30º Prêmio Angelo Agostini como melhor
desenhista, dois dos mais importantes prêmios de quadrinhos nacional. Três
Buracos comprova a qualidade excepcional em produzir boas histórias alinhadas a
uma arte inesquecível. Seu traço é excepcional e a riqueza que dá para os
personagens nos transporta para cada cena.
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