Filme difícil, cruel, perturbador,
incômodo, mas muito realista. Coringa, filme dirigido por Todd Phillips é
assustador. Fala sobre os excluídos, a inequalidade social e a desigualdade
entre ricos e pobres, não a jornada de um homem psicótico que mata apenas por
matar. Foca em um sujeito, um rosto na multidão que vive sem perceber que a
maquiagem que ostenta em sua miserável carreira de palhaço de rua ou de
animador de crianças em hospitais representa, na verdade, a insensatez com que
ele enxerga o mundo. Subitamente, ele “descobre” que sob a pele do palhaço há
poder, há sentido, e há, sobretudo, audiência. Todo o desespero de uma
existência vã transforma-se em energia vital para que uma multidão troque sua
personalidade por uma máscara onde a violência é um ritual que tem no Coringa
sua expressão máxima, um ídolo que ousou combater o poder, a democracia, as
instituições.
Coringa é um narcisista, profundamente
melancólico. O filme trabalha em camadas, cada qual propondo um gatilho que
fará o inseguro, torturado e frágil Arthur se transmutar no colossal vilão
também conhecido como Palhaço do Crime. Em um mundo onde tantos se sentem
injustiçados, o Coringa representa o achatamento do indivíduo e o triunfo de um
coletivismo que não percebe que empodera justamente quem abre mão da
identidade, da racionalidade para fazer da loucura, da anarquia e do caos um
modo de vida.
Nada diferente de nossa realidade, onde
influenciadores são seguidos cegamente, onde a polarização dá as cartas a
partir de informação comandada por algoritmos, sem espaço para a reflexão, para
a nuance, para o meio-tom. Coringa está por aí, em praticamente todos os
lugares, à espera de um gatilho para trazer caos ao mundo. E acredite: estamos
criando gatilhos para a insanidade como nunca antes na história.
Coringa trouxe um reflexo assustador. Tudo
é constituído com densidade, desde a fotografia, trilha sonora até o cenário
nauseabundo. A trilha sonora é outro
ponto a ser observado. As músicas escolhidas para cada cena do longa compõem
não apenas o ritmo do filme, mas nos conduzem pelos sentimentos do
protagonista. As mudanças de tons de cada trilha foram metodicamente pensadas
para causar a sensação desejada em cada cena. Além de atormentado por uma
vontade incontrolável de rir, ele também possui uma inclinação para a dança.
A fotografia é também outro grande trunfo
do longa. Não há hesitação em tornar Coringa um filme de aparência doentia,
suja e mal iluminada. Tudo sobre a narrativa foi projetado para ser opressivo e
levar o público ao ponto de vista de Fleck como a principal vítima de toda essa
opressão. Coringa faz provocações reais a respeito de problemas reais e
pulsantes como instabilidade mental e políticas armamentistas, sobre a falha
dos serviços sociais com quem mais precisa deles, sobre os ricos satisfeitos e
os pobres enraivecidos, e sobre pessoas que gritam tão alto que não se pode
ouvir os próprios pensamentos. De fato, tudo está ficando mais louco.
PALHAÇO
DO CRIME
Coringa é um dos maiores personagens da
cultura pop. Sua personalidade mudou drasticamente no decorrer dos anos, seja
por causa de censuras impostas aos quadrinhos ou para torná-lo mais sádico.
Essas mudanças também são bastante representativas nas adaptações, já que o
personagem já foi interpretado por quatro atores diferentes: Cesar Romero, Jack
Nicholson, Heath Ledger e Jared Leto.
Ele nasceu nos quadrinhos da DC Comics em
1940 e, desde então, já invadiu os desenhos animados, filmes e seriados que
envolvem o mundo de Batman. O personagem foi o primeiro vilão psicopata a ser
criado. Sádico de aparência bizarra e dono da reputação de mais perigoso
personagem dos quadrinhos. Para o maníaco, cada transgressão é baseada numa
piada, geralmente de humor negro, quase sempre levando suas vítimas a morrerem,
literalmente, de tanto rir. Ele ainda explica que o personagem foi programado
para morrer nesta edição. Quando o Coringa apareceu a primeira vez, ele estava
programado para morrer. Mas o editor-chefe da DC Comics, Whitney Ellsworth,
enxergou a grandeza do personagem e não deixou os autores o matarem.
A criação do Coringa foi inspirada na
performance do ator Conrad Veidt, em O Homem Que Ri (The Man Eho Laughs), um
filme mudo de 1928. Por sua vez, o filme é uma adaptação do romance O Homem Que
Ri de 1869 (há 150) do escritor francês Victor Hugo.
Na era de ouro dos quadrinhos, 1930, era
muito comum um super-herói lutar com um cientista maluco, mas o Coringa foi
diferente. Ele é um cara psicopata e insano. E, com a vinda da Comics-Com, na
década de 50, o personagem deixou de ser psicopata e virou um palhaço do crime.
No Brasil o Coringa apareceu pela primeira
vez em 1942, com o nome de Risonho e, depois, o Bobo. O criminoso só teria sua
origem revelada 11 anos depois de seu surgimento, na revista Detective Comics
n.168 em fevereiro de 1951.
Um comentário:
Ótimo texto !
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