
Ana Montenegro nasceu em Quixadá,
no Ceará, no dia 13 de abril de 1915. Quando pequena olhava para as terras do
pai e só conseguia imaginar que os verdadeiros donos eram aqueles que ali
labutavam. Enviada para um colégio de freiras, não cogitou crer nos santos -
apesar da admiração pelo “moço de Nazaré” e pelo Sermão da Montanha (“dai de
comer a quem tem fome e de beber a quem tem sede”). Assim cresceu a jovem com
ideias socialistas. Foi morar, em seguida, no Rio de Janeiro. No México,
prestou concurso para as Organizações não-governamentais e daí então seguiu
palestrando sobre questões femininas e acabou vindo parar em Salvador, a
trabalho, antes de se formar em Direito. Formada em História e bacharel em
Direito, ela tem o título de Cidadã de Salvador pela atuação destacada que teve
ao longo da sua vida em defesa das liberdades democráticas e os direitos
humanos.
Veio morar na Bahia em 1979,
depois de 15 anos no exterior, porque a filha, a fotógrafa Sônia Carmo, já
morava aqui. E foi nesta terra que soube mais sobre a luta do Corta-Braço,
Jacinta Passos (poetisa politizada) e as freiras do Convento do Desterro que no
começo do século passado impressionaram Frei Caneca com suas atitudes sociais.
Era 1947, tempos difíceis para a invasão do Corta-Braço. De noite as mulheres
ficaram de fazer vigília para que a polícia não pegasse todo mundo
desprevenido. Ana temeu pela sorte das semelhantes naquele escuro e aprendeu um
pouco mais sobre a fibra feminina. Foi
aqui que Ana Montenegro guardou seu arquivo de pesquisa - pastas e mais pastas
de coisas escritas à mão, conforme surgem as informações e observações.
Ela fez
o primeiro concurso público do Departamento de Administração do Serviço Público
no começo da década de 40 e foi nomeada, trabalhando no serviço de previdência
social no IAPI, a primeira instituição de previdência que surgiu no Brasil.
Aqui ela ficou dois anos. Esteve em Cuba apoiando o então recém instalado
governo de Fidel Castro, aprendeu sobre a revolução conversando com Che
Guevara, escreveu para a revista Mulheres do Mundo Inteiro, distribuída em
nível planetário pela Unesco, foi conferir de perto as guerrilhas da
Guiné-Bissau na década de 70.
Ana Montenegro destacou-se por
uma ativa participação da mulher, desde a redemocratização do país em 1945,
após a ditadura de Getúlio Vargas. É uma das fundadoras da Federação de
Mulheres do Brasil, e do extinto jornal Momento Feminino. Até 1964 participou
da Frente Nacionalista Feminina, ocupando a Secretaria da Liga Feminina, do
Estado da Guanabara (hoje Estado do Rio de Janeiro). No Rio, atuou na imprensa,
principalmente os jornais Tribuna Popular e Novos Rumos. Foi casada, teve dois
filhos.
Primeira mulher exilada após o golpe de 1964, sem nunca abrir mão de
suas bandeiras por igualdade

Pertenceu desde 1945 à direção do
Partido Comunista Brasileiro, onde desenvolveu um trabalho sério e respeitado,
em defesa dos direitos humanos, pela valorização da participação da mulher nos
movimentos sociais, pela elevação do nível de organização da classe operária
brasileira. Foi membro do Conselho Nacional da Mulher e integrou o Conselho
Municipal da Mulher. O conceito de feminismo da militante, que escreveu longos
artigos para os jornais locais, deu palestras e lutou pelos direitos dos sem
teto nas favelas e invasões, vai muito além das bandeiras comportamentais
popularizadas a partir dos anos 60. Boa parte de seu arquivo particular está na
Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFBA que abriu um espaço, Núcleo
de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher.
Tem vários livros publicados: Ser
ou Não Ser Feminista (1981), Mulheres Participação nas Lutas Populares (1985),
Tempo de Exílio (1988), Crônicas e Poemas (1995) e Uma História de Luta (sobre
Marighela). Entre seus ensaios estão sobre Simon Bolivar, O Papel da
Universidade, Esterilização, Contracepção e Efeitos Democráticos, O Papel da
Advogada na Comunidade, Pelourinho, entre o Colorido das Paredes e a Injustiça
Social, e Mulher e Constituinte. Devota de Jesus Cristo, no sentido filosófico,
Ana Montenegro comoveu-se com os fatos que a cercam e, às vezes perdia a
paciência com intolerância. Baixinha ela gostava de andar nas ruas da cidade de
braços dados com os amigos, procurando ajudar a todos. Já foi agraciada com medalhas do Sindicato
dos Trabalhadores em Telecomunicação da Bahia, da OAB, entre outras. A Câmara
Municipal de Salvador outorgou em agosto de 1993 a Medalha Maria Quitéria a Ana
Montenegro pelo exemplo de vida da militante, sempre dedicada as lutas das
mulheres de Salvador, principalmente num momento em que o Brasil vive uma crise
ética e valores morais. A memória histórica das lutas populares - dos
trabalhadores, dos negros, das mulheres - está, sempre presente no que escreve
e em suas palestras e conferências. Sua poesia é a expressão de seus
sentimentos de solidariedade a essas lutas.
Montenegro faleceu no dia 30 de março de 2006, aos 90 anos, de falência
múltipla dos órgãos.(Esta biografia
conta no livro Gente da Bahia. Volume 2. Editora P&A, 1998)
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