26 abril 2018

Um artista íntegro: Wilton Bernardo


Há mais de 20 anos que Wilton Bernardo vem ministrando cursos para crianças e adolescentes. São suas Oficinas de Histórias em Quadrinhos. A arte é importante na vida da criança, pois colabora para o seu desenvolvimento expressivo, para a construção de sua poética pessoal e para o desenvolvimento de sua criatividade, tornando-a um indivíduo mais sensível e que vê o mundo com outros olhos. O sucesso das Oficinas de HQs ministradas por Wilton se deve a sua prática pedagógica que valoriza a arte, assim como suas linguagens artísticas, procedimentos, desenvolvimento da criatividade e poética pessoal da criança como conteúdos que devem estar presentes constantemente. Também um ambiente adequado, o domínio por parte do professor do que está sendo ensinado e o conhecimento sobre o desenvolvimento expressivo da criança, seu entusiasmo e, acima de tudo, conhecer cada aluno e trabalhar com a sua realidade, sempre de forma contextualizada, proporcionarão aulas de Arte significativas

Wilton Bernardo estudou Artes Visuais na UFBa, trabalhou em agências de publicidade como diretor de arte, redação, ilustrador e assessor de comunicação. Hoje atua na Rede Bahia. Em 2007 criou a marca Laço Afro e desenvolveu ilustrações inspiradas na cultura afro-brasileira. Estas ilustrações se desdobraram em peças de moda, design e artesanato como camisetas, canecas, chaveiros em madeira reciclada. Inclusive uma de suas ilustrações foi capa do meu livro “Bahia, um estado d´alma”, lançado em 2009. Ele é também criador da personagem de quadrinhos Dona Dedé que possui uma página no facebook.



Como surgiu esse seu interesse pelas artes gráficas?

Wilton Bernardo - Meu interesse acho que surgiu junto com o de todas as crianças, lá no jardim de infância, quando começamos a desenhar, antes mesmo de saber escrever.Mas falando por mim, acho que nesse período o interesse por desenho, pintura se instaurou, e não saiu mais.

O que você gosta de ler nos quadrinhos?

WB - Eu gosto de ver histórias interessantes onde o principal são as relações, o ser humano.obviamente gosto de ver temas variados nos quadrinhos. Tenho meus heróis, gosto de humor, mas as relações é o que mais me interessa. E isso norteia meu gosto em outras expressões artísticas como nos filmes, no teatro ...


Quais são suas maiores influências?

WB - Sinceramente, não é uma resposta fácil. Acredito que há variadas influências ou inspirações. E como a construção, ainda que pensando em inspiração, pode ter diversas fontes, as influências também. Mas eu citaria Milo Manara, citaria a indústria Disney. Mas acho que depois de muito tempo tem duas pessoas que me marcaram sobremaneira: Marjane Satrapi (autora de Persépolis) e Art Spiegelman(autor de Maus).

O que lhe inspira quando está no processo de criação?

WB - Não existe uma fórmula. O que inspira pode ser tudo que dialogue com aquele assunto, com o tema em que se pesquisa. Acredito que a pesquisa, acaba norteando muitas das possibilidades de inspiração.


Qual a informação que alimenta o seu trabalho?

WB - O que alimenta o meu trabalho, definitivamente é a pesquisa. É como trilhar um caminho que não se sabe onde vai dar, mas é o norte, pra acertar, ou no mínimo, fazer algo dentro do que foi proposto, do que foi desejado.

Você tem um site na internet.. Fale desse espaço

WB - Eu tenho o www.oficinahq.com que sofreu várias transformações. Começou como um grande portal, depois reduzi o campo de abordagem, mas serviu desde 2004 quando foi criado (A Ação Cultural Oficina HQ eu criei em setembro de 2003), como base para mostrar profissionais da área das artes gráficas, divulgar eventos, e realizar exposições online de artistas gráficos de todo o Brasil. Neste momento o site está sendo repensado novamente, para provavelmente voltar a ser hospedado num suporte mais modernos, atual.

Além do site www.Oficina HQ.com tenho o meu pessoal (www.wiltonbernardo.com) que é meu portfólio, é onde registra os meus trabalhos mais relevantes na área das artes gráficas e do design.


Você utiliza muito a ferramenta digital em seus desenhos?

WB - A ferramenta digital entra de um jeito ou de outro. Normalmente eu crio tudo no lápis e papel. Dou origem às coisas com o lápis e papel. Depois finalizo digitalmente.

O que você mais gosta de fazer hoje?

WB – Criar. O meu grande tesão sempre foi e acredito que será sempre criar. Seja o que for, dentro das artes gráficas, do design. Criar soluções, inventar. Sempre tem uma ou outra pessoa que fala “Nada se cria, tudo se copia”, e essa frase, definitivamente não me representa.. rsrsrs

Eu percebi isso em mim, sabe quando? Quando eu desejei trabalhar na empresa de Maurício de Souza. Teve uma época em que eu cheguei a fazer algumas etapas de avaliação. Bom, para apresentar Dona Dedé, tive o maior entusiasmo, responder as perguntas que era uma outra etapa, foi tudo bem, mas na hora de desenhar os personagens do Maurício.... eu simplesmente não fazia... e eu admiro muito toda a história daquele homem. Admiro demais! Mas a questão começou a ficar claro pra mim: o meu tesão era criar, não copiar, não representar criações de outros. Claro que eu respeito todos que fazem, graças a Deus, existem diversas funções dentro dessa indústria, e cada pessoas tem um prazer, seja roteirizar, desenhar, arte finalizar, colorir, enfim. O importante é fazermos aquilo que realmente nos deixa feliz.


Não é dificil fazer humor no Brasil, pois vivemos num país paradoxal e o paradoxo é a essência do humor. O que tem a dizer sobre isso ?

WB - Humor bem feito é realmente uma coisa maravilhosa. O nosso país sempre rendeu muito conteúdo para se fazer humor. Mas mesmo assim, falando por mim, eu digo que não acho fácil. Acho uma das coisas mais difíceis. Tenho personagens onde exploro o humor mas considero uma das coisas mais desafiadoras.

No Brasil de forma geral, vivemos um momento social e político seríssimo. O mau gosto, o desrespeito pode  estar ali, bem pertinho do humor, se deixar, é fácil ele aparecer.

Durante os anos 70 a publicidade usou o grafismo, o cartum e o desenho de humor como apelo. E hoje?

WB - Hoje a fotografia, os efeitos hiper realistas e o vídeo são grandes ferramentas. Acho que não se extinguiu, mas as ferramentas mais fortes são essas 3 citadas.


Porque a imprensa baiana fechou suas páginas para o cartum e os quadrinhos nesses anos de crise política e econômica. O que pensa a respeito disso?

WB - Acho que o buraco é mais embaixo. Vejo a imprensa baiana muito mal das pernas, digamos assim. Está rebolando pra sobreviver, nessa transição de papel para o digital. Isso significa corte de páginas, redução de conteúdo, e luta pra publicar o que “vende”, “o que a Bahia quer ver” que acho até que é slogan do jornal CORREIO. O que os baianos querem realmente ver, não vou arriscar dizer, mas quadrinhos definitivamente, de uma forma geral, não acho que seja. É um momento de transformação e adaptação também desse conteúdo. Claro que durante toda a história, toda expressão artística vai se moldando, se transformando, e de alguma forma, refletindo os dias que correm. Nem todos os artistas conseguem ser atuais, e por isso mesmo existem variados estilos em tudo que é expressão de arte. Mas o norte, o que segue na frente apontando o futuro é o que reflete os dias que correm, e eu diria que nos quadrinhos, a grande abertura de temas, o crescimento da produção autoral, é uma das grande transformações positivas. O foco no ser humano, nas relações. Mas assim como os jornais que não fecham as portas estão lutando para se adaptarem, os quadrinhos também. Acho que caminhamos para um futuro onde troca-se a expressão “eu gosto de quadrinhos de tal segmento” pra dizer “eu gosto desse” ou “gosto daquele”. Isso em outras expressões artísticas é natural, nos quadrinhos ainda não está tão claro, me parece. EU vejo a maior valorização do autor, e menos de grandes indústrias ou editoras. Mas em relação ao suporte, as coisas ainda estão se definindo. 

Em uma de suas vertentes, tem um trabalho voltado para o quadrinho infantil. Fale sofre isso.

WB - Dona Dedé é uma personagem que tem um apelo infantil dependendo da abordagem. Há tiras que tocam em assuntos mais próximos  delas, porém, admito que com o passar do tempo as tirinhas foram ficando cada vez mais adultas. Não sei se você lembra mas Eu criei Dona Dedé como trabalho final do curso de História dos Quadrinhos que você ministrou na Fundação Casa de Jorge Amado! Faz um tempão, mas foi “o dever de casa” que você passou que me fez debruçar e criá-la! Faz tanto tempo e eu não fiz uma publicação impressa dela. Como se passaram tantos anos (a primeira aparição impressa no jornal a tarde com Dona Dedé aconteceu em 1997), eu resolvi redesenhar tudo e lançar 1 ou 2 publicações. Estou definindo, e espero fazer isso ainda neste anos de 2018.


Você criou personagem e quadrinhos, como e quando foi publicado. Qual sua característica?

WB -  Dona Dedé foi publicada desde 1997 em jornal impresso e depois internet.Agora ela tem até uma página no Facebook com postagem que ultrapassa 1 mil compartilhamentos e curtidas. Ela está toda metida(risos).
Há outros personagens, e projetos, mas o que não está publicado, não se fala correto?

Em 2012 você criou os personagens Paxuá e Paramirim. Conte sobre eles

WB - O livro Paxuá e Paramim, foi publicado em 2012 com 2 índios crianças que se preocupam com o meio ambiente, preservação da natureza . O texto é do Carlinhos Brown cuja produção me convidou para ilustrar a história infantil. Mas quando fui me reunir com a produtora, ainda não existiam os personagens, havia apenas os nomes Paxuá e Paramim. Então eu desenvolvi a estética, a imagem dos personagens. Não tinha como ilustrar sem criar primeiro os personagens. Então, depois dos personagens criados,  ilustrei o livro infantil que foi distribuído durante uma exposição de artes plásticas que o cantor fez na Caixa Cultural de Brasília.


As personagens são duas criancinhas peladas, pintadas. Quando se pensa em índio parece que é fácil deduzir a aparências deles, mas me lembro que diante desse desafio de fazer 2 personagens índios, eu fiquei cheio de interrogações, pois cada grupo, tem suas pinturas, suas especificidades. Tive que recorrer a um amigo que trabalha há anos com comunidades indígenas – O Ricardo -  para poder entender um pouco dessas pinturas, e assim, poder compor os personagens com algo marcante, algo que ajudasse a criar uma identidade forte, até porque elas não possuem roupa. Eu os representei naturalmente pelados. Não tem sainhas de penas, nada disso. As pinturas nesse caso, tem uma função super forte na construção da individualidade (estética) dos personagens. Na época o Brown chegou a sugerir colocar um alargador no índio, mas deixaria o personagem sem expressão, e acabei convencendo de não colocar. Me orgulho muito dessa realização. Cada criação é como se fosse um filho, no fim das contas. 


Para você o que apareceu de mais significativo nesses dias nas artes gráficas?

WB -  Em relação a artistas, eu não tenho nome específico para citar, mas tem um monte de gente nova mostrando as caras. E nesse caso, eu citaria a democratização das mídias digitais. É uma revolução que ainda não se definiu para os quadrinhos por exemplo. Há um desafio de se conseguir colocar o conteúdo da forma mais adequada... é um momento ainda de descobrir isso. Nesse sentido acho que a música e o cinema já passaram por um desconforto maior e agora percebo um que estão se “ajeitando”. Na minha opinião, nós das artes gráficas ainda estamos num lugar de experimentação, tentativa de adequação.  

Você já participou de publicações independentes?

WB - A maior parte do meu trabalho gráfico teve saída através do mercado publicitário – Outdoors, cartazes, folders. Uma desses rendeu prêmio internacional, para a capa do Jornal CORREIO (24/09/2013). E em relação a quadrinhos mesmo, publiquei pouquíssimo, no ambiente virtual. Tive poucas tiras e cartuns publicados no jornal A Tarde (gratuitamente) pois eu enviava esse material como leitor para um colunista que escrevia sobre arte – Herbert Magalhães – e ele publicava o que gostava. Depois publiquei no ambiente virtual – num portal e por fim, no facebook. 


Quem são hoje, para você, os bons chargista e caricaturistas?

WB -  Com certeza tem vários novos talentos. Mas eles chegam pra enriquecer um time de muita gente excelente que continua a ai. O Brasil tem talento demais, então vou citar alguns que conheço e bato palmas, que são os baianos Gentil, Flávio Luiz, Davi Sales, Hector Salas, Amauri Alves, Isadora Sabar, tem gente demais, não consigo lembrar todos os nomes. 

Seu site oficinahq é voltado para os interessados no desenho de humor?

WB - Na verdade, o site surgiu como uma forma de manter contato com os alunos e ex-alunos das Oficinas de Quadrinhos que comecei a ministrar desde 2003 e continuo até hoje. Com as turmas, comecei a realizar exposições e precisava de um lugar onde eu pudesse disponibilizar conteúdo, mostrar os talentos do mercado, falar de lançamentos, e também disponibilizar os trabalhos que participavam de exposições. Eram pessoas do Brasil todo enviando material. O site funcionava como um suporte maravilhoso junto com o Blog que noticiava o que eu realizava em termos de eventos – Oficinas, exposições, mostra de filmes, e outras notícias culturais das mais diversas áreas. O site oficinaHQ.com está passando por uma nova atualização, mas o Blog oficinahq.wordpress.com  está no ar.  


Há mais de 20 anos você vem ministrando cursos para crianças e adolescentes. São suas Oficinas de Histórias em Quadrinhos. A arte é importante na vida da criança, pois colabora para o seu desenvolvimento expressivo, para a construção de sua poética pessoal e para o desenvolvimento de sua criatividade, tornando-a um indivíduo mais sensível e que vê o mundo com outros olhos.  Conte um pouco sobre essas oficinas, quantos alunos, no total, já passaram pela sua oficina?

WB - Eu ministro oficinas desde 2002. Comece a ministrar Oficinas de Quadrinhos e desenho no Shopping Ponto Alto, ainda sem ter uma marca. Lembro como se fosse ontem que conversei com o gerente do Shopping e apresentei a proposta. Ele disse: “Se um jornal noticiar, você realiza o projeto aqui no Shopping”. Eu consegui. Depois organizei o projeto e apresentei a Dona Matilde Matos – crítica de Arte  e uma das fundadoras da EBEC Escola de Inglês -  junto com sua filha Claudine Toulier. Elas abraçaram o projeto, abriram as portas da EBEC Escola de Inglês e Galeria de Arte para mim. Lá ministrei muitas oficinas por vários anos. Depois fiz parcerias com Aliança Francesa, Acheu, Museu Carlos Costa Pinto, e por fim, estou realizando as Oficinas atuais em parceria com a Faculdade Ruy Barbosa. São mais de 32 turmas. Mais de 320 alunos considerando apenas a Oficinas de Quadrinhos. Acontece que a Oficina de Quadrinhos recebe alunos a partir de 13 anos e havia muitas crianças menores que desejavam participar das oficinas, por isso eu criei a Oficina de Desenho e Criação de Personagem. Ao todo deve ser quase 500 alunos já.

Sempre foi super desafiador, porque, de 13 a 70 anos, tive alunos até hoje das mais variadas áreas, e nos mais variados estágios: Produtor de Ivete Sangalo, professor de EAD do SENAI, artistas plásticos, publicitários, pré vestibulandos, psicólogos, jornalistas, advogados arquitetos, etc. Super desafiador dialogar com tanta gente com discursos diferente, porém, mas obviamente que estavam ali tendo o interesse em aprender, aprimorar seus conhecimentos acerca das histórias em Quadrinhos. Ao mesmo tempo que é desafiador, é uma delícia. Eu verdadeiramente amo fazer isso. É um prazer incrível! Tanta gente talentosa eu conheci através dessas oficinas!

Já as turmas de Desenho e Criação de Personagens eu tive alguns colaboradores a quem sou bastante grato. Lucas Pimenta e Isadora Sabar me ajudaram a tocar as turmas de desenho para menores em vários momentos. Estar em sala de aula é realmente fascinante.


Quais seus projetos futuro?

WB - Tenho vários projetos para realizar na área das artes gráficas, mas não acho que vale a pena contar enquanto ainda não acontecem. Prometo que lhe conto assim que algo for confirmado.





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