12 março 2007

Do poema processo ao experimentalismo na linguagem (1)

Montando palavras-imagens que se desenvolveram no espaço, acrescentando informações em ritmo dinâmico, os poetas de vanguarda abriram novas veredas para a poesia, fazendo valer para o poema a sua visualidade e dinâmica, como queira Mallarmé. Apollinaire dizia que “a nossa inteligência deveria habituar-se a compreender sintético-ideologicamente, em vez de analítico-discursivamente”. Depois do movimento da Poesia Concreta, liderados pelos irmãos Campos (Augusto e Haroldo) e Décio Pignatari e de alguns outros movimentos como o neo-concretismo e o práxis surge o poema/processo que leva à radicalização total a visualização: a palavra some do poema, ficando apenas os sinais.

O Poema/Processo foi lançado como movimento de vanguarda em 11 de dezembro de 1967, através de duas exposições simultâneas, no Rio (Escola Superior de Desenho Industrial) e em Natal (Galeria Sobradinho). Ao mesmo tempo era lançada a revista do grupo, Ponto 1. Os poetas Wlademir Dias Pino, Moacy Cirne, Sanderson Negreiros e Álvaro de Sá, os mais atuantes do grupo poema/processo romperam com o próprio conceito abstrato de poesia (= sentimento). Primeiro procurou-se, de forma mais radical, a separação ou dissociação entre o que é poesia de um lado e poema do outro. Para isso, conceituou-se a Poesia como problema ligado à língua (acaso geográfico) e o Poema, o que se faz com experiência, na área da linguagem. Entende-se como linguagem, não o fenômeno lingüístico, isto é, a linguagem falada por um povo, mas sim, a que é cinema (visual) ou matemática (técnica).

O poema de processo – diz Wlademir Dias Pino, precursor do movimento (A Ave 1956, Sólida 1966) -, sob esta condição, não está preocupado com o estado poético, como fator de maiores estudos, nem mesmo com a experimentação lingüística; mas tem o propósito de deixar bem claro que essa separação mostra, de maneira indiscutível, que o poema é físico – até mesmo total – em sua visualidade gráfica, enquanto que a poesia é puramente abstrata. Tanto assim é que é comum a expressão poesia de arquitetura.

Poema;Processo é aquele que, a cada nova experiência, inaugura processos informacionais. Essa informação pode ser estética ou não: o importante é que seja funcional e, portanto, consumida. Para Moacy Cirne o poema/processo “não é uma mera ou simples continuação do concretismo: o poema/processo é uma continuidade radical, implicando desdobramento semiológicos próprios, de uma das direções da poesia concreta”. O ideal de poema/processo é a estrutura. Manter a estrutura em aberto, em constante processo, ou seja, em constante relacionamento de suas partes, para que o objeto estético seja mostrado por dentro, em seu processo. O movimento do poema/processo (p/p), nunca teve teoria, mas apenas apanhados metalinguísticos de experimentação prática, reunidos dos mais diversos poetas e das mais diversas partes do país e até mesmo do mundo.

Propondo um rompimento qualitativo com a poesia tradicional (modernista e pós modernista) pela radicalização das linguagens, foi realizada em abril de 1968, no Museu de Arte Moderna da Bahia a IV Exposição Nacional de Poema/Processo. Entre os participantes do movimento (com nove estados representados) estavam Erthos Albino de Souza – desenvolve mais a poesia concreta – e Anselmo Santos – faz levantamento de linguagens. A exposição constou de objetos-poemas e cartazes-poemas, além dos debates e conferências.

Quatro anos depois, em 1972, Haroldo Cajazeira forma com Orlando Pinheiro, Nivalda Costa, Jurema Brandão e Julio César Lobo um grupo de estudos de linguagem. Foi por essa época que Antônio Luis Morais de Andrade, estudante de Arquitetura, artista plástico, poeta, aparece com seus objetos-poemas na página Gente Jovem pede Passagem do Jornal da Bahia. A grande riqueza visual aliada à semântica da proposta fazem de Almandrade um dos mais criativos operários da linguagem. Um construtor. Em 1973 participa da Bienal de São Paulo com o Grupo Etsedron. Nesse mesmo ano é realizado no Jardim da Piedade a Feira da Poesia (em 72 foi realizado a I Exposição Coletiva de Poesia Experimental). Segundo Almandrade, as pessoas (estudantes e intelectuais) não aceitavam o novo enquanto que o povo, que não conhece nada sobre aquele assunto, aceitava, compreendia e participava. Na feira havia um livro de Erthos, todo perfurado, feito pelo cartão de computador. Pois bem, teve gente que resolveu perguntar onde estava a poesia naquele livro. Será que fugiu pelos buraquinhos?

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