10 agosto 2018

Palavra em Movimento, de Arnaldo Antunes



A palavra, seja falada, escrita, desenhada, fotografada, filmada, construída ou cantada, está no centro das atenções na mostra que o artista, herdeiro da poesia concreta dos anos 1950, do rock and roll e do tropicalismo dos 1960 e 1970, da arte pop e do movimento punk dos anos 1980.

A exposição Palavra em Movimento, que abre na Caixa Cultural Recife, marca três décadas de produção visual de Arnaldo Antunes. A abertura ocorre no dia 16 de agosto. A mostra, em circulação desde 2016, já passou por cidades como São Paulo, Brasília, Fortaleza, Rio de Janeiro, Florianópolis e Salvador. Segundo o curador Daniel Rangel, a maneira integrada de criar de Arnaldo Antunes é inspirada na poesia concreta e remete à expressão joyceana “verbivocovisual”, que sintetiza a proposta, colocada em prática nos anos 1950 pelos concretistas brasileiros, dos novos modos de se fazer poesia, visando a uma “arte geral da palavra”.


“Palavra em Movimento” reúne caligrafias, colagens, instalações e objetos poéticos, além de adesivos, banners, áudios e vídeos de trabalhos realizados nos últimos trinta anos. É uma síntese da trajetória do artista vanguardista no circuito das artes visuais contemporâneas. “Trata-se de um artista do presente, que aborda temas atuais; conceitos políticos, comportamentais, ecológicos, espirituais e poéticos, para diversos públicos e em contato com diferentes mídias”, explica Rangel.


Na análise de André Gardel (http://www.sesc.com.br/portal/site/palavra/dossie/artigo/verbo+viajante+palavra+corpo+e+performance+poetica+em+arnaldo+antunes) Arnaldo estabelece um livre trânsito entre a indústria “major” e a “minor”, entre os espaços “cults” e “bregas”, oficiais e alternativos, entre o erudito e o popular, entre os “happy few” e a massa. E é justamente essa postura transicional, de Hermes-Mercúrio mensageiro multicultural e interartístico, que propicia o exercício e ampliação do viés “pedagógico” de sua produção. Pois é a partir da potencialização das forças que tencionam a palavra poética, nômade, distendendo-se e reverberando, de modo recorrente, em todos os meios de expressão a que se dedica, que vem à tona seu ideário último: a revitalização, multimídia, de um estado de linguagem – primitivo, semiótico, performativo – em que nome e coisa, objeto e signo surgem como um único e mesmo fenômeno pulsante. Num resgate de uma situação e de um momento originários em que a linguagem torna-se corpo e o corpo, linguagem.


Assim, a obra de Arnaldo Antunes vem trazendo para o universo da cultura popular, de modo sistemático e com grande poder inventivo, elementos expressivos que fincam raízes em algumas das mais importantes experimentações de vanguarda culta. Tentando, direta ou indiretamente, diminuir o fosso existente entre experimentação formal e ampliação de público. Outros artistas e movimentos na música popular comercial brasileira fizeram e/ ou fazem o mesmo. No entanto, a obra de Arnaldo Antunes, apesar de se inserir nessa tendência, mantém uma singularidade muito específica.


Dos poetas e do movimento concreto, Arnaldo devora, como bom antropófago que se alimentou da cartilha canibal do modernista Oswald de Andrade, o instrumental linguístico e semiótico; a inserção da escrita ideogramática na escrita alfabética, que incorpora a estrutura analógica à lógica discursiva ocidental; a pesquisa gráfica e caligráfica revitalizando o verbal; a contaminação multimeios; a poesia visual de fundo construtivista; a proesia; a busca isomórfica de significação entre signo verbal e referente, similaridades fônicas e ambiguidades semânticas etc. E do Momento Tropicalista que, por si só, já é uma deglutição pop de proposições modernistas, Arnaldo incorpora uma criação que enfrenta, de modo plural e muito pessoal, o jogo artístico que se desdobra da dialética contemporânea entre novidade e tradição, estética culta e de massas.

Nenhum comentário: