Curiosidades, intrigas e reviravoltas. É
assim que os jornalistas Manoel de Souza e Maurício Muniz mostram toda a saga
da Abril, desde os obscuros gibis e livros que a editora fez questão de
esquecer, até os títulos que encantaram várias gerações por mais de seis
décadas. E a dupla foi a fundo nas origens da editora dos Civita e sua relação
com os quadrinhos, uma trajetória que passou pela Itália, Estados Unidos e
Argentina, até chegar ao Brasil, onde provocou uma revolução cultural. A
incrível história dos quadrinhos da Editora Abril, O Império dos Gibis é o
título do livro lançado pela Editora Heróica.
Para os autores, a Abril foi a editora que
mais lançou quadrinhos em nosso país. Foram 17.970 lançados pela Abril em um
registro de quase112 mil edições brasileiras registradas até junho de 2020.
César Civita investia primeiro em
publicações destinadas acrianças e jovens. Seu projeto tinha a ver com
esperança, vida nova. “Como a aquecida
mudança das estações na Europa, quando o
inverno dá lugar à primavera no mês de abril. Veio daí o nome Editorial Abril,
cujo logotipo traria uma pequena árvore estilizada, que representava a
fertilidade” (pag.15). A nova Editorial Abril debutou no mercado em 1941 na
Argentina. Passados três anos, César começou a investir nas historietas (como
os quadrinhos são chamados na Argentina). Em 1944 surgiu El Pato Donald,
revista de 32 páginas e formato 19,5cm por 28cm. Com periodicidade semanal,
trazia parte das páginas coloridas (em quatro cores), parte duas cores (em
preto e magenta) e o restante em peto e branco. A revista chegava a vender 120
mil copias semanais – número que chegaria a 300 mil em 1948, o que motivou
César a investir em outras historietas.
A tríade “livros infantis, quadrinhos e fotonovelas”
sustenta a Editorial Abril em sua primeira década. Em 1947 César criou uma
espécie de filial de sua editora no Brasil. Nascia a Editora Abril Ltda.
“Entre janeiro e junho de1950, as bancas
brasileiras receberam cerca de 250 edições do gênero, lançadas por diversas editoras,
como Ebal (com Aí, Mocinho!, Edição Maravilhosa, O Herói e Superman), O Globo
(Biriba Mensal, Gibi, Gibi Mensal, Globo Juvenil, Globo Juvenil Mensal, Novo
Gibi, Shazam! e X-9), O Cruzeiro (O Guri), Grande Consórcio Suplementos
Nacionais (O Lobinho), Vecchi (O Pequeno Sheriff) e O Malho (O Tico Tico e
Tiquinho), entre outras. Para concorrer com todo esse pessoal, Victor Civita
investiu em dois títulos mensais: um de aventuras (Raio Vermelho) e outro
focado nos personagens Disney (O Pato Donald). Ambos extremamente calcados nas
experiências de seu irmão na Argentina” (pag.28).
A revista O Pato Donald seria totalmente
impressa em quatro cores a partir de julho de 1956. E em dezembro de 1959, foi
publicada a primeira HQ da Disney 100% criada no Brasil: Papai Noel por Acaso,
com 12 páginas desenhadas por Jorge Kato, publicadas em O Pato Donald 424. Kato
faria parte de um rol de funcionários que teria longa carreira na Abril. Teve
ainda Reinaldo de Oliveira, Claudio de Souza, Alvaro de Moya, Waldyr Igayara,
Ignácio Justo e muitos outros.
“A primeira metade dos anos 1960 foi um
período de decisões que mudaram profundamente a cara da Abril” (pag. 57).
Victor Civita tornou-se sócio majoritário da empresa. “Essa entrada tardia se
deu por conta da demora de sua naturalização brasileira”. Assim o intercâmbio
com a Editorial Abril diminuiu bastante e as empresas que nasceram como irmãs,
tomariam rumos bem diferentes. “Enquanto o governo argentino continuaria considerando
César Civita um inimigo estrangeiro, seu irmão Victor soube lidar melhor com os
militares que tomaram o poder no Brasil e com as instituições locais” (pags 57,
58).
Passados quase 15 anos da vinda de Victor Civita
ao Brasil, a editora contava com 18 publicações e mais de 4,5 milhões de exemplares
vendidos mensalmente. Em 1970 a Abril já dominava o segmento de quadrinhos
infantis e a editora mirou em Mauricio de Souza. Em maio chegava às bancas
Mônica e sua Turma com tiragem de 200 mil exemplares. Cebolinha ganharia seu
título solo em janeiro de 1973. No final de 1970, a Disney-Abril contava com
quatro revistas – as quinzenais O Pato Donald e Zé Carioca e as mensais Mickey
e Tio Patinhas. Ao completar sua primeira década no final de 1973, Tio Patinhas
era umas das publicações mais vendidas do Brasil, com picos de mais de 500 mil
exemplares por edição. Era a maior revista em circulação do Brasil.
Para suprir os títulos, a editora contratou
mais quadrinhistas e sentiu necessidade de formar jovens talentos. Jorge Kato
coordenou a Escolinha Disney auxiliada por Primaggio Mantovi. Surgiu a revista
Crás! com Nico Roso, Walmir Amaral, Jayme Cortez, Jose Lanzellotti, Ruy Perolti
entre outros. A revista durou seis edições, lançadas entre 1974 e 1975.
Experiência vanguardista que pagou o preço alto pela falta de estrutura e
planejamento editorial mais coerente, avaliaram os autores do livro.
Em 1985, a editora dos Civita havia
colocado 403 diferentes títulos de quadrinhos nas bancas. Dessas, 97 eram da
Mônica e sua turma. Em 1986, foram 489 gibis no total, com 102 vindos do
universo da baixinha dentuça. Naquele período, as revistas de Mauricio de Sousa
representavam algo entre 20% e 25% do setor de quadrinhos da Abril. Nascia ali
um clima de disputa entre Abril e Globo.
Na Globo a revista da Mônica subiu de 268
mil exemplares mensais (1986) para 347 (1987). O mesmo período, Cebolinha subiria
de 210 mil pra264 mil, Chico Bento de 174 mil para 264,5 e Cascão de 174 mil
para 240 mil. O ápice de Mauricio na Globo foi entre 1987 e 2006, que chegou
ater 6,3 milhões de revistas vendidas em um mês e nunca ficou abaixo dos3
milhões de exemplares mensais. O autor se consolidou como um fenômeno à parte
no instável mercado editorial.
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