O poeta St. John Perse gostava de dizer que todo livro nasce da morte de uma árvore. E como escreve o jornalista Sérgio Augusto, a dívida da palavra impressa com a celulose de que se alimenta é grande. Basta observar que book, bouquin e Buch derivam de boscus, bosque, e livro vem de líber, o tecido condutor da seiva das árvores. Poetas e prosadores utilizaram, a árvore como fonte de inspiração. Pinhos e magnólias eram celebrados por Francis Ponge, o baobá no imaginário de Antoine de St. Exupéry e Roger Caillois, no tronco do ipê de José de Alencar ou no meu pé de laranja lima, de José Mauro de Vasconcelos. E os versos que Drummond criou pensando nas mangueiras de sua infância e nas amendoeiras de sua idade adulta.
E não ficou só na literatura. A
árvore encontrou campo fértil na gravura e na pintura a partir do Renascimento.
Durer, Bruegel, Corot, Poussim, Cézanne e muitos outros desenharam de tudo
quanto é jeito. Nos desenhos animados, Walt Disney é imbatível. As árvores
falam e contam todo o seu sofrimento e alegrias com os humanos.
Pulmões da Terra e abrigos
seguros, sem as árvores as paisagens murcham e o ar empobrece. Elas nos dão
além de brisa e vento, flores, frutas, êxtase, lenha e matéria-prima para uma
infinidade de coisas: casas, móveis, papel, rolhas, embarcações, talheres,
armas, tamancos, instrumentos musicais, pneus, etc... O biólogo australiano Tim
Flannery, autor do livro “The Weather Makers” lembrou que, até hoje, nós mal
sabemos o que vem a ser, precisamente, uma árvore. Até duas décadas atrás
podíamos estar convencido de sabermos, mas o estudo do DNA balançou todo o
conhecimento, colocando o cogumelo mais perto do homem que da couve-flor e
provando que a teça, árvore indiana de grande porte, é parente muito próxima do
orégamo e do manjericão. Flannery se espanta ao registrar que, últimamente, os
botânicos põem os carvalhos mais ou menos ao lado dos pepinos. Desta forma, as
árvores têm uma história épica, com grandes aventuras migratórias gravadas em
seu genoma.
Colin Tudge, autor de “The Tree”
informa que há espécies que podem ser árvores ou arbustos, dependendo d onde
resolvam fincar raízes. Além de árvores que, no passado, foram trepadeiras ou
mesmo ervas rasteiras. E árvores já é assunto do momento. Enquanto o inglês
Thomas Pakenham retrata com sua câmara Linhof plantas de vários continentes, o
engenheiro florestal Harri Lorenzi já está na nova edição de “Árvores
Brasileiras”.
Uma pesquisa publicada na
Califórnia afirma que remover as árvores do planeta pode esfriá-lo. Segundo o
novo estudo, como as florestas são muito verdes e fechadas, elas conseguem
absorver mais o calor do sol que outra vegetação, tornando o clima mais quente.
As árvores, até hoje, eram consideradas fundamentais por sequestrar o carbono
da atmosfera (presente nas moléculas de CO2 que aquecem o clima).
As árvores se transformaram num
símbolo ímpar, apresenta em quase todas as religiões arcaicas. Sejam maias,
babilônicos, nórdicos e germânicos representavam com eles o cosmo. Os gregos as
veneravam. Os lituanos (antes de serem convertidos ao cristianismo) praticavam
abertamente a dendrolatria, o culto à árvore. E até o cristianismo tem uma
simbólica macieira em sua mitologia. Suas características morfológicas, sua
verticalidade, imobilidade, frondosidade e longevidade, pela força de sua
presença e seu poder de regeneração, elas são símbolo ímpar, presente em quase
todas as religiões arcaicas.
As árvores exercem um fascínio
imenso sobre nós. No livro “O Homem e Seus Símbolos”, sobre a obra de Carl
Gustav Jung, Marie Louise von Franz compara o desenvolvimento do ser humano ao
das plantas. A semente contém o futuro pinheiro. Mas reage às circunstâncias,
como qualidade do solo e vento, inclinando-se em direção ao sol e modelando o
crescimento da árvore. Assim também acontece com o homem, de maneira espontânea
e inconsciente, ela escreveu. Os celtas acreditavam que há muito em comum entre
as árvores e as características das pessoas. Tanto que criaram um oráculo baseado
nas plantas. Há 20 anos, Liz e Colin Murray resgataram esse conhecimento e
escreveram The Celtic Tree Oracle, com 24 cartas, que incluem bétula, álamo,
freixo, árvores típicas da Europa. Esse oráculo tem relação com o alfabeto
celta, e criado pelos druidas com base em gestos dos dedos, conta a
pesquisadora Wicca Mirela Fahur, autora do livro O Legado da Deusa. Adaptado
para o Hemisfério Sul, o oráculo traz árvores tropicais, como coqueiro e
goiabeira. Carvalho, ipê, oliveira e jacarandá representam as pessoas que
nasceram em datas especiais de mudança de estação no Hemisfério Norte.
E o nome Brasil foi tirado de uma
leguminosa, imortalizamos a chegada da corte de D. João VI com o plantio de uma
palmeira imperial, cultuamos o mito de que “nossos bosques têm mais vida” e
cultivamos o hábito de dar as pessoas e lugares patronímicos como Oliveira,
Carvalho, Laranjeiras e Mangueira. Agora falta ter um relacionamento mais
afetuoso com as árvores.
Um comentário:
Uma postagem muito interessante com belas imagens. Há conteúdo valioso por aqui. Um abraço.
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