Quando a minissérie foi publicada no
Brasil em 1990 pela Editora Globo o sucesso foi imediato. Agora a minissérie
escrita por Neil Gaiman e ilustrada por Dave Mckean é republicada numa edição
de luxo com direito a capa dura, pela Opera Graphica Editora. Trata-se de
Orquídea Negra. A personagem surgiu pela primeira vez no nº428 da revista
Adventure Comics, agosto de 1972. Participou das histórias da Supermoça,
apareceu na revista Super Friends e foi integrante da antiga legião dos Super
Heróis, sempre sem passado nem futuro, apenas com o presente. Depois passou a
fazer parte do Esquadrão Suicida na série Crise nas Infinitas Terras para logo
em seguida desaparecer.
Gaiman e McKean pegaram a personagem
totalmente obscura e criaram uma obra-prima. A graphic novel tem visual
inovador. A história da personagem é recontada de outra maneira e toma novos
rumos cheios de beleza e poesia. Num ambiente cinzento e corrompido pelo poder
de um magnata sem escrúpulos chamado Lex Luthor, a Orquídea Negra ressurgir
como a mais rara das flores. Na verdade, ela é um ser híbrido que necessita das
mesmas condições que uma planta precisa para sobreviver. Mas ela não é uma
planta...nem uma mulher...A Orquídea Negra é um enigma cuja solução encontra-se
em seu próprio passado.
Em busca de suas origens, ela depara-se
com seres bastante incomuns como o Monstro do Pântano, Hera Venenosa e o Homem
Morcego. O autor dessa nova origem é o escritor inglês Neil Gaiman (Sandman, o
Mestre dos Sonhos). Usando uma técnica mista que mistura tinta e óleo com tinta
spray para carros e filtros de tecido sobre aquarelas, o desenhista Dave Mckean
trabalhou as imagens da minissérie mantendo apenas o tom do uniforme da Orquídea,
cor púrpura, intacto. Os cenários mudavam de tonalidade de acordo com a
situação e o estado de espírito dos personagens. Lembra o filme de Bergman,
“Gritos e Sussurros”, ou mesmo o trabalho do desenhista Bill Sienckiewicz.
A narrativa mostra como Philip Sylvian, um
botânico que estudou na mesma classe de Pamela Isley (futura Hera Venenosa,
inimiga de Batman) e Alec Holland (que se tornaria o Monstro do Pântano),
desenvolveram criaturas mistas de planta e ser humano. Essas criaturas, geradas
a partir de orquídeas, foram feitas à imagem de uma outra botânica por quem
Sylvian era apaixonado. Mas cada uma das plantas carrega em si uma espécie de
memória genética que é despertada conforme cresce, e uma série de incidentes
pode impedir essas memórias de despertarem totalmente. As criaturas têm poderes
enormes e uma tendência a fazer o bem, mas não sabem se devem se importar mais
com plantas ou seres humanos.
O problema começa a surgir no momento em
que o ex-marido da musa que inspirou as orquídeas de Philip sair da cadeia e
envolver Lex Luthor na história. Luthor passa a fazer de tudo para dominar o
segredo das orquídeas. Ao mesmo tempo, duas delas - uma adulta e uma criança -
tentam manterem-se vivas, longe de Luthor e reiniciar o plantio de sua raça.
Na obra, Orquídea Negra busca sua
identidade tal qual uma criança inocente que começa a conhecer o lado negro do
mundo: o Asilo Arkham. “Ela é uma flor – conta Neil Gaiman -, não uma divindade
da natureza como o Monstro do Pântano. O termo técnico que usei para ela foi
Rainha da Primavera com todas as implicações que isso traz, inclusive vida
curta. Os Monstros do Pântano vivem eternamente, as Rainhas da Primavera não.
Elas representam beleza, inocência, pureza e paz”.
Antes que Dave pegasse o lápis – conta Neil
– nós conversamos sobre o que queríamos fazer com a atmosfera de cada número da
minissérie. A decisão inicial foi de que a primeira parte seria muito direta,
ousadamente realista. Tudo acontece em cidades e salas dentro de um mundo feito
pelo homem”. Os tons arroxeados da Orquídea convivem com o cinza, o preto e o
branco, do mundo ao seu redor. “Na segunda parte, começamos a explorar outras
coisas como o Central Park de Gotham City e o cemitério nos fundos do Asilo
Arkham. Ainda são locais feitos pelo homem, mas há profundezas estranhas
neles”. As cores se misturam gradativamente.
Ao fazer a última parte, sabíamos que tudo
aquilo tinha que sair bonito, porque tudo acontecia em áreas selvagens: as
flores tropicais da Amazônia e os pântanos da Louisiana. Em vez de minúsculos
borrifos de cor num mundo cinzento, nós temos minúsculas pessoas cinzentas
movendo-se dentro da bela floresta tropical. E é neste último número que há uma
explosão de cores. Orquídea encontra o Monstro do Pântano, e acaba na Amazônia,
onde enfrenta agentes de Lex Luthor. Em cada imagem sequenciada, a fusão do
expressionismo figurativo e abstrato com o impressionismo numa atmosfera de
sonho, imaginação, memória. Essa viagem através da arte estonteante de Mckean
atravessa caminhos que parecerão novos, mas que sempre estiveram lá, apenas
nunca havia sido trilhados. E tudo começa com uma orquídea e um pôr-do-sol.
Belo. (Texto publicado neste blog inicialmente em 28 junho 2006).
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