11 setembro 2009

Poesia, poesia, poesia para melhorar o dia-a dia

(Oito poemas para o final de semana)

Tanto

Há tanto para amar, tanto admirar
um rio se diluindo no mar
ou as areias do deserto a contemplar.

Há tanto para sonhar, tanto para realizar
olhar as ondas de areia ou os cardumes de pedras
tudo fruto de terra dentro do agreste mar.

Há tanto para fazer, tanto conhecer
o aflorar do amor adolescente em minha vida
e o rio passando sem pretender ficar.

Não sei se fico ou se vou
de onde vim e aonde vou chegar
só sei o que quero, amar, amar, amar, amar
vivendo nas margens do rio para no deserto fecundar.




Língua


Foi aquela língua solene que cantou louvores
preencheu de rios, abriu os caminhos,
ousou quebrar o livre instante
parou o tempo e instaurou tempestade.

O proibido, o não consentido, o que era carnal
escreveu sobre o meu corpo, letras de puro gosto
enquanto a língua delineava as curvas do perigo
o desejo ampliava a paixão, amor, ternura, tesão.

E as mãos negras espalmadas sobre a minha pele branca
floresceu numa união de corpos preto e branco.
O verde é o que vejo agora sobre o peito nu de esperança
escrevendo o seu nome na pele como pergaminho.

Leio em sua língua, seus contornos
desespero do meu nome que não ousa dizer
murmurando mil vezes contra o vento
como se fosse um mantra suave de prazer.

Há tempo que não me olhas e sentes
muitas vezes vi você ir embora, covardia
e o perfume de sua saliva impregnada em meus segredos
e os dedos sobre minha pele trocando nossos cheiros.

Você estava em uma foto antiga, proibida
e eu tinha um verbo incompleto, incerto.
Verbos impossíveis de tocar ou congregar
quando tocam o céu com a língua.

Quero soletrar minuciosamente o seu nome
em vários tons, várias cores e sabores
para tocar fundo as suas fogueiras
e acender as chamas de todas as maneiras.

Escreve com pena, tinta e saliva
sobre a minha pele úmida
sua marca, seu selo, seu desvelo
para estampar nosso amor sem desprezo.


Anoitecer

O dia se deita diante de mim
e me acorda fazendo assim, assim.
O calor do sol me esquenta mais e mais
e vejo meu caminho na gravura da favela
quem é ela, quem é ela?
Meus olhos cansados não querem se abrir,
as retinas pesadas se fecham enfim,
e volto a me encobrir com o dia
para anoitecer em meu interior,
será sonho ou puro amor?

Chave

Como uma chave na fechadura
um prazer que dura,
sim, na sua boca,
na sua pele,
na onda dos seus cabelos,
nos seus pelos.

Fugindo pela língua, pelos lábios,
esse seu expressar calmo,
que voa direto aos meus sentidos,
causando a chama que arde tremula.
E a minha vida de masculinidade
se mescla com a sua feminilidade.



Oriente

Se você não sabe de onde vem
Nunca saberá pra onde vai.

Se você não sabe o eu quer
Nunca saberá o que fazer.

Se você não gosta de ninguém
Nunca poderá amar você.

Isso é apenas um dilema
Uma teoria, um teorema
Que você poderá desvendar
Com auxílio de alguém ou algo lá
Mas você nunca poderá fazer sozinho
Pois sua vida depende do equilíbrio
Da cuíca, da foice ou um caminho
Qualquer pedra no meio do seu ninho.

Mas o que você precisa saber
Estudar, trabalhar e conhecer
Ver o mundo e saber de seus valores
Suas vivências sensíveis como as cores
Ritmos e gostos de uma pele bronzeada
Seja branco, preto ou amarelada
O que importa e o brilho do saber.
Seja você!


Tradução

Desfamiliarização
É buscar um sentido social
Para me aproximar de você
E sentir um olhar de irônica tristeza
Na bela e feroz delicadeza
Desse amor que é só certeza
Mesmo exilado, tímido e solitário
Somos separados pela semelhança
Mas nada disso falta esperança
Pois no contrário da lembrança
A ausência revela a essência
E hoje paciência, tormenta, existência
Para esperar sua imagem nítida,
Próxima, reluzente, quente
E sentir seu calor.
E nessa aventura de energia, sentimento de urgência,
Dúvida e contradição
Reinvento sua pintura íntima como tradução
Sei que o terreno é minado, e busco não ser tachado
De mera recordação.

Jogo

O mundo de hoje virou um jogo
um jogo de pião da criançada
nesse jogo tudo está interligado.
Resolver contradições não passam
para abrandar essa parábola
a existência aqui é estagnada
e a lógica é pra lá de binária.

Para conhecer a realidade,
pula o rio e nos largamos na correnteza,
aprendendo a ser um com o todo,
ou ficamos na margem desse rio
ou seguimos a correnteza, com certeza.

É difícil suportar as mudanças,
desse mundo exterior,
é melhor começar no interior,
para depois exigir todas as cobranças.

O homem brinca apenas se for humano,
e é inteiramente humano se brincar
quando começamos finalmente a ser humano
nada disso eu posso afirmar.

Só sei que criança joga fora seu brinquedo
quando começa a crescer, mas tudo flui,
tudo nasce, cresce e morre
e a vida continua no alvorecer.

No mundo moderno do trabalho,
cada ação serve a uma outra ação
que por sua vez serve a uma terceira,
e assim infinitamente.

Enquanto estamos presos nesse processo,
sem pensar, sem viver, sem respirar
vamos vivendo satisfatoriamente
sem sentir, sem amar e sem gozar.

Mas pode acontecer um aborrecimento
e tudo pára, tudo pesa, tudo rui,
a angústia toma conta do que não fui
e me faz acordar desse pesadelo.


Canto

Ah esse poema que teima
em não me obedecer,
escorre no papel com tinta e mel
num canto quente de força
de feridas e dissabores.

Esse canto não é de acalanto,
é canto carregado de amargura,
de mágoas e medos, fomes e desejos.

Esse canto que não quer parar
de escorrer na folha em branco,
quer cicatrizar sua pele de banto
e resguardar sua essência de pranto.
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2 comentários:

Unknown disse...

Parabéns Gutemberg... Eu amo as suas poesias..me espiram para um novo amanhecer,um novo amar enloquecer nas suas palavaras como todo. Beijos....

Gutemberg disse...

Andrea,

Escrever poesia não é meu forte, gosto muito de escrever prosa, mas a poesia me fascina. Às vezes, no ônibus, as palavras chegam como um vulcão e tenho que escrever em um papel qualquer que aparece em minhas mõs. Tudo muito rápido. Às vezes são devaneios, tristeza, melancolia. É isso! Agradeço as palavras de carinho. Forte beijo
Gutemberg