12 março 2009

Cordel, manifestação cultural popular

Na época dos povos conquistadores greco-romanos, fenícios, cartagineses, saxões, a literatura de cordel já existia, tendo chegado à Península Ibérica (Portugal e Espanha) por volta do século XVI. Na Península a literatura de cordel recebeu os nomes de folhas soltas (Espanha) e folhas volantes (Portugal). Florescente, principalmente, na área que se estende da Bahia ao Maranhão essa manifestação impressa em papel barato era utilizada para contar as grandes histórias, os grandes romances. O dramaturgo francês Molière divulgou suas peças através dos folhetos. Fausto, obra maior de Goethe, foi publicada inicialmente em um folheto. Ariano Suassuna se inspirou em vários folhetos para fazer O Auto da Compadecida.


O cordel, trazido de Portugal além de entretenimento era instrumento de informação jornalística, numa época em que as notícias não chegavam ao interior, isso há um século atrás, aproximadamente, e ainda cumpriu a função de alfabetizador pelo método natural de ouvir (era lido em voz alta), memorizar, ler e escrever.

De custo baixo, geralmente estes pequenos livros são vendidos pelos próprios autores. Fazem grande sucesso em estados como Pernambuco, Ceará, Alagoas, Paraíba e Bahia. Este sucesso ocorre em função do preço baixo, do tom humorístico de muitos deles e também por retratarem fatos da vida cotidiana da cidade ou da região. Os principais assuntos retratados nos livretos são: festas, política, secas, disputas, brigas, milagres, vida dos cangaceiros, atos de heroísmo, milagres, morte de personalidades etc. Em algumas situações, estes poemas são acompanhados de violas e recitados em praças com a presença do público.

Como uma manifestação cultural popular, o cordel ultrapassa a visão representativa para se tornar produção de linguagem, ultrapassa a noção de obra e autor. Ele produz uma “realidade” nascida da reatualização de uma memória popular que entrelaça acontecimentos das mais variadas temporalidades e espacialidades. Presentificando-as, colocando-as acima do tempo corrosivo da história, uma prática discursiva que inventa e reinventa a tradição e, como tal, interessava a um grupo de intelectuais também preocupados com a estabilidade espaço-temporal.

Construído com histórias que circulariam em toda a área, histórias de cangaceiros, de santos, de coronéis, de milagres, de secas, de cabras valentes e brigões, de crimes, de mulheres perdidas, do sertão mítico, repositório de uma pureza perdida. A estrutura do cordel, com seus recetativos e heptassílabas acentuados na terceira e sétimas sílabas, fornece uma forma de expressão, uma dicção perfeitamente adaptada para se falar do Nordeste, onde todos os discursos lembram lamúrias, cantilenas, incelências, lamentos.

Alguns escritores dividem a presença do cordel no Brasil em duas fases. A primeira fase começa há 100 anos, quando os portugueses o introduzem pelos portões da Paraíba. A segunda fase começou por volta de 1979, momento em que o cordel foi sufocado pela grande imprensa, tempos de ditadura militar no país. Para evitar que o gênero morresse, promoveu-se um congresso internacional, aqui na Bahia. Desta forma, o movimento ganhou força e muitos cordelistas estabeleceram-se por aqui. O papel da Bahia na continuação desse gênero foi tão importante que fica sediada em Salvador, num espaço urbano, a Ordem Brasileira dos Poetas da Literatura de Cordel. E um de seus cordelistas e repentistas mais ilustre é Antônio Ribeiro da Conceição, mais conhecido por seu nome artístico, Bule Bule.

O cineasta Glauber Rocha descobriu que o cantador de cordel era, em grande medida, um ator brechtiano. Na medida em que não apenas interpreta a história, mas é, em grande parte, o seu autor e condutor. Ao incorporar os mitos do cordel, ele elaborou uma espacialidade anti naturalista de grande inventividade imagética. A poesia de João Cabral de Melo Neto busca no cordel, nos autos de natal, formas de expressão mais direta, mais comunicativas. A economia verbal, a musicalidade da palavra, a combinação eufônica ou gráfica das palavras, a necessidade de serem ditas mais do quer ouvidas.

E não foi só a literatura, a poesia, o cinema e o teatro a utilizar toda a estrutura do cordel, as artes plásticas também aproveitou dessa fonte popular através da xilogravura, as histórias em quadrinhos também desenvolveu um segmento especial. E apesar da morte tantas vezes anunciada ao longo dos tempos, a literatura de cordel continua um expressivo meio de comunicação. Enquanto expressão cultural, permanece adaptada, reinventada, no desempenho de suas funções sociais e políticas. Informar. Formar, divertir, criticar, conscientizar, socializar ou poetizar, conforme os diferentes temas que retrata e o enfoque abordado. A literatura de cordel enriquece a já reconhecida pluralidade cultural do nosso Brasil.
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Dia 26 tem lançamento do livro “Bahia, um estado d´alma” no Espaço Uni Banco de Cinema (Galeria do Livro)

Um comentário:

Paulo Timm disse...

Caro e desconhecido amigo: Sempre publico seus bons e belos artigos no meu site www.alexania.tv, uma tentativa de inslcusão cultural num pequeno município de Goiás , onde moro depois de aposentado. Parabéns pela sua atividade intlectual que hoje é reconhecida por muitos sites e blogs do pais, dentre os quais o meu e o blogflexão PAULO TIMM paulotimm@hotmail.com