O desejo feminino está presente durante o ano todo e não tem sequer limites fisiológicos – da ereção – que se impõe pesadamente ao homem. E é esta fraqueza masculina que, em matéria amorosa, faz da mulher o verdadeiro sexo forte. Isso justifica uma boa parte do mundo que a sexualidade feminina inspira a inúmeros autores licenciosos da antiguidade.
Nos animais há o ciclo repetitivo, regular e obrigatório (produz a ovulação e o cio) que substitui a moral sexual. Os humanos escaparam desta regulação obrigatória, tributária do relógio biológico, tornando-se necessário que a cultura substitua a natureza, codificando e organizando a sexualidade. E é a partir deste ponto de vista que alguns antropólogos disseram que “é o sexo que faz a sociedade” (Albert Ducros, La Frontière dês sexes, PUF, 1995). Assim, o sexo não é uma função e sim uma cultura. Ele se situa na junção do biológico com o cultural, no centro da oposição entre o inato e o adquirido, entre o que é dado pela natureza e o que é conquistado pela cultura.
Os interditos de uma sociedade para outra sugerem que toda codificação cultural de sexualidade repousa sobre o “pensar a diferença” entre o feminismo e o masculino, ou, em outros termos, sobre uma diferenciação sexual de funções e de tarefas entre o homem e diferenciação sexual de funções e de tarefas entre o homem e a mulher. Esta diferenciação biológica leva em geral a uma desvalorizada e subalterna do papel feminino. E o movimento ocidental de libertação sexual se empenhou em combater o peso deste diferencialismo.
A permanência da misoginia em certas culturas humanas deve ser atribuído a este “pensar a diferença” e também ao temor suscitado por uma sexualidade feminina vista como insaciável e sem limites fisiológicos determinados.
Um debate nas universidades sobre a oposição natureza versus cultura seria bastante edificante e a sociedade ganharia se fosse uma discussão ampla e pedagogicamente vulgarizada. Possibilitaria colocar sob uma perspectiva adequada certas querelas atuais, como, por exemplo, o estabelecimento de quotas (“discriminação positiva”) para favorecer a presença de mulheres na política.
Para alguns estudiosos, a caça que dá origem aos progressos da humanidade. É ele que – exclusiva do homem, por razões biológicas - teria feito dele o inventor da cultura e teria colocado a mulher na condição de sua dependente. Para outros, enquanto o homem caçava, as mulheres desenvolviam técnicas de colheita, de armazenamento, de fabricação dos primeiros recipientes, de cestas para transporte dos filhos, coisas todas que, por definição, estão na origem mesma da cultura.
Antropólogos citam exemplo de sociedades matriarcais, em que as mulheres que detêm o poder. Nas ilhas Trobriana, no Pacífico, a iniciativa sexual está na mão das mulheres. Também as mulheres estão na força de seis nações iroquesas do Canadá. Nas nações indígenas, as mulheres gozam de direitos e poderes que não se equivaliam aos de nenhuma outra parte do mundo. Nos terreiros de candomblés as mulheres estão na maioria.
Diferenciação baseada no sexo (a idéia da diferença) não conduz necessariamente a uma hierarquização de poderes em favor dos homens. Há exceções. Há o argumento evolucionista – o que uma evolução fez, uma outra pode vir a desfazer, em virtude de uma diferente definição de eficiência social.
No sistema cultural judaico-cristão, Eva aparece no Antigo Testamento, que começou a ser escrito em 1450 a.C., em que a primeira representação da divindade numa imagem de mulher foi substituída pela idéia patriarcal de um Deus como um pai autoritário e punitivo e que determinou serem as mulheres inferiores aos homens. No judaísmo o pecado original não era um erro carnal e sim um pecado de conhecimento e competição com Deus. O cristianismo é muito mais severo com as mulheres. “Não permito à mulher ensinar nem dominar o homem; que ela se mantenha, portanto, em silêncio. Foi Adão o primeiro a ser modelado. Eva, só depois. E não foi Adão o seduzido e sim a mulher e que, seduzida, caiu na transgressão” (Primeira Epístola a Timóteo, 2:2-14). Eva tenta Adão e, pelo caminho do pecado original, caímos na condição humana com todo o seu sofrimento. Parece ficção, mitologia, enredo de filme, mas a humanidade acreditou nessa narrativa.
Assim a cultura judaico-cristã considera o sofrimento uma virtude e o prazer, um pecado. Controlar os prazeres das pessoas é controlá-las. O prazer sexual, por pertencer à natureza humana e atingir a todos sem exceção, sempre foi visto como o mais perigoso de todos. É o mais controlado, portanto. A condenação da Igreja à prática carnal continua intensa, mas por baixo dos panos, esses sacerdotes estão em altas orgias (faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço). Olhe só o exemplo de um deles, o Marques de Sade, muito ligado a religiosidade e deu no que deu!
Um comentário:
muito bom
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