22 dezembro 2021

O amor dá sentido a vida

 

Não sei porque estou escrevendo nesta noite de sábado. Sim, não sei porque. Confortar a alma, talvez. Sei que estou só. Simplesmente só. Fagner toca na vitrola e eu choro a sua ausência. São 22h30min. Jorginho e Sérgio passaram aqui com três rapazes. Todos alegres vão descobrir a noite.  Eu fiquei aqui no quarto pensando em ti. Esperando um telefonema, uma carta ou algo de você que sei que não vem. E volto a chorar.  Os olhos estão encharcados de lágrimas...como gostaria de te-lo aqui comigo. Como é difícil conviver com a solidão.

 


Durante o verão você brilhou comigo. Em cada canto da cidade estavaamos juntos, unidos. Lembranças....a passagem do  ano e nós no Fantoches brincando, a noite cansado, dormimos juntos. O feriado do dia primeiro a sua fuga para as festas de largo e depois o arrependimento. E nos dias que se seguiram, foram todos de festas. E você não perdia uma. Eu perdia você naqueles momentos. Mesmo assim não censurava. Você era a própria festa. A lavagem do Tororó e a nossa farra. A minha fuga para Olinda e o seu perdão. O nosso encontro louco no último dia de folia. Seus olhos brilhavam e sua boca ardia de desejos. Os nossos abraços em Arembepe, o rolar na areia,os beijos....tudo isso são momentos felizes. Como posso esquecer? Você é uma presença forte em minha vida. Uma coisa que já faz parte de mim. Agora mesmo estou pela metde. Confuso. Sem saber o que fazer. Minha outra parte está longe de mim. Com certeza no inverno de Conquista. Enrolado nos cobertores. E aqui, neste final de verão, volto a ficar só. É terrível.

 


Enquanto uma parte de mim delira na estranheza desta solidão, a outra parte é só vertigem Traduzir essas partes se faz necessário. E quando me afundo em mim, sinto  saudades, porque dentro de mim tem você. E é você que eu procuro neste quarto vazio, nesta noite, neste mundo, nesta vida. Dá vontade de jogar tudo pra cima e correr ao seu encontro. Viajar hoje mesmo. Agora. Porque não faço? Daqui há algumas horas vou descansar esta cabeça pesada no travesseiro e dormir. E tenho  certeza que vou sonhar com você perto de mim. Sonha sim....pelo menos é alguma coisa...melhor do que nada. Mas o que acontece? Será que vai ser sempre assim. No melhor, a separação. Não consigo me conformar. Sei que sou apressado no querer as coisas. Mas desta vez as dores da separação são muito fortes. Acho que é a primeira vez, neste 1982, que passo um fim de semana sem você em Salvador. E a dor quem salva? A esperança de t encontrar amanhã. Ela é quem dá força pra continuar nessa vida.

 


Levanto e troco o disco  de Alceu Valença pelo de Simone. Milton Nascimento e Fernando Brant me conforta com seu poema Amar. “Amar é a melhor maneira de viver”, diz um trecho do poema. “É o que a gente tem de bom”. E é desses dois poetas que transcrevo Amor Amigo, um trecho: “Para mim você é a luz/que revela os poemas que fiz/me ensina a viver/me ensina a amar/quem conhece da terra e do sol/muito sabe os mistérios do mar”. Mais uma: “Um dia ele chegou tão diferente/do  seu jeito de sempre chegar/olhou-a de um jeito mais quente/do que sempre costuma olhar/E não mal disse a vida tanto o quanto/era seu jeito de sempre falar....”

 


Lembra? Sem você a vida para mim nada significa. Te amo e  tempo não varreu isso de mim. O fruto que tenho é o bastante para querer. Para amar. E o amor é o que nos guia, nos une. E por mais que eu diga ou escreva, é sempre bom lembrar que o amor é tudo na vida. É ele que dá sentido a vida. É ele que nos faz viver...Falta poucos minutos para meia noite. O piano de Egberto Gismonti corta a noite e a voz suave de Olivia Byington torna-se mais clara, mais crua. E eu volto a chorar, mais forte. Não sei porque, mas esta canção me faz mais fundo, mais mudo. “A minha solidão é sua/De certo sei que você vaga/Em qualquer parte/Sob essa vaga lua”. Sei que já deliro e choro, e nada mais sei, e nada mais imploro. Só espero dormir  sonhar com você em frente a porta desse quarto, em que embarca sob essa vaga luz, e a luz da lua, apura a nitidez da marca, mais nua, mais clara, mais crua. Boa noite amor. (Salvador, 06 de março de 1982, às 24h).

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