07 setembro 2019

Obra para todos: O marido do meu irmão


A obra venceu o 19º Prêmio de Excelência do Japan Media Arts Festival, em 2015; o Grande Prêmio da Associação dos Cartunistas do Japão e o Eisner Award, ambos em 2018. O Marido do Meu Irmão, de Gengoroh Tagame, lançamento da Panini, em dois volumes, mostra como a tolerância precisa ser exercitada, incentivada. É a primeira obra de Gengoroh Tagame para um público mais abrangente. Autor de mangás do gênero Bara (com conteúdo gay para adultos), Tagame declarou em uma entrevista na época do lançamento da obra que a intenção era fazer um trabalho que conversasse com o público heterossexual, a fim de quebrar o preconceito com pessoas LGBT, uma vez que o Japão é bastante conservador nesse sentido.


O livro é realista ao tratar de questões importantes no Japão, que ainda vê a homossexualidade como algo anômalo aos seus costumes. O país é hoje uma das poucas nações industrializadas que não tem leis para o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo e nem uma legislação anti-discriminação. O Marido do Meu Irmão, dentro desse contexto, é uma obra contra a desinformação.

A série em dois volumes mostra o cotidiano de um trio inusitado de personagens. E é uma história sensível e cativante. O irmão gêmeo do dono de casa Yaichi se mudou para o Canadá há 10 anos e se casou com o engenheiro Mike. Após o falecimento de seu marido, Mike decide viajar pela primeira vez ao Japão para conhecer seu cunhado e sua filha, Kana. A chegada de Mike a essa típica casa japonesa de classe média vai desestruturar a rotina de todos. E isso tem um motivo bem claro: a homofobia.


O preconceito muitas vezes se comporta de maneira não-combativa, menos virulenta, mas igualmente danosa. Fica como uma neblina tênue, da qual se fala muito pouco, mas que também tem seu impacto. Yaichi se depara com seus medos e preconceitos, mas se vê em conflito com a conhecida hospitalidade do Japão. Já Mike se depara com um mundo diametralmente oposto ao seu estilo de vida livre fora do armário. Vindo do Canadá, um país reconhecidamente aberto em relação aos direitos gays, ele começa a perceber um mundo mais fechado e rígido. Essas diferenças culturais geram estranhamento em ambos e tiradas engraçadas.


A questão cultural  também é abordada. Para aqueles que não sabem, o Japão é um pais relativamente reservado em relação aos seus sentimentos. A frustração não pode ser evidenciada e um sorriso falso, mesmo que não goste da pessoa, é visto como algo educado a se fazer. Até mesmo as relações de pai e filho, apesar de com carinho, são acima de tudo, relações de hierarquias. “O coletivo importa mais que o indivíduo” e, por isso, eles acabam tendo diversos problemas emocionalmente falando. Situar uma história com um tema desses em um país que não se importa tanto com o individual foi algo instigante. O contraste com um país que abraça a diversidade a ponto da maioria de seus moradores serem estrangeiros, como é o Canadá, é a cereja do bolo.


Um adicional são os comentários sobre a história da comunidade LGBT descrita entre alguns capítulos, que mostram a luta através dos tempos, curiosidades sobre a bandeira e os diferentes grupos de LGBT que existem. Em tempos de intolerância, uma história que fala sobre (auto)aceitação, empatia e luta pelo direito de ser quem se é, se faz mais do que necessária. O Marido do Meu Irmão é uma obra para todos.


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