No dia 11 de setembro de 2014 (há cinco
anos) morria o desenhista Antônio Cedraz. Ele faleceu vitima de câncer. Na
época ele diversas homenagens quando vivo. A Biblioteca Monteiro Lobato, no
bairro de Nazaré abriu uma sala com seu nome. A RV Cultura e Arte montou uma
exposição onde diversos desenhistas homenagearam as personagens de Cedraz. Ele
também recebeu a honraria de uma universidade como mestre de quadrinhos. Em
maio gravamos um documentário em sua casa em Brotas sobre sua trajetória. Em 2015 a Flica homenageou o quadrinista.
Cedraz vinha publicando ininterruptamente
no jornal A Tarde as tiras A Turma do Xaxado. “Tudo começou em 1998, quando
Sérgio Mattos editor do caderno Municípios, do jornal A Tarde pediu-me para
fazer algumas histórias com um personagem interiorano. Levei algumas tiras de
Xaxado, imediatamente aceitas e publicadas duas vezes por semana. Logo depois,
o personagem migrou para a seção de quadrinhos do jornal e passou a ser
publicado diariamente. Depois, vieram cartões telefônicos, revistas em
quadrinhos, revistas de atividades, exposições, seis troféus HQ Mix e mais de
duas dezenas de livros publicados. Muitas outras surpresas estão por vir”,
conta Cedraz na apresentação da obra.
“A Turma do Xaxado mergulha sobre as
lendas e sobre a dura realidade do sertão, sem descuidar da crítica social, e
produz um resultado tão eclético que às vezes é difícil precisar a que faixa
etária se destinam as histórias. Xaxado agrada igualmente a criança e o adulto.
Diverte, ensina e chama à reflexão. Num mercado editorial saturado de criaturas
super-qualquer-coisa, que só falam inglês, é um colírio encontrar uma
publicação que fale de nossas raízes e dá voz aos que passam por inaceitáveis
desamparo em pleno século XXI”, informa Cláudio Oliveira, mestre em Letras que
defendeu dissertação sobre A Turma do Xaxado. Nesse livro tem ainda uma
apresentação dos personagens em forma de cordel, feitas por Antonio Barreto.
A simplicidade e originalidade do autor em
muito se assemelha aos seus personagens, seja ele Xaxado (o líder da turma,
neto de cangaceiro), Zé Pequeno (o preguiçoso), Marieta (sabe-tudo da
turminha), Arturzinho (filho de fazendeiro abastado), Seu Enoque e Dona Fulo
(pais de Xaxado), entre outros. Eles dão vida, humor e significado também a
cultura baiana.
Num mercado restrito que é o do grafismo
no Brasil, onde há descrença que quadrinho nacional não vende, na Bahia pior
ainda. Aqui não temos editoras para publicar as criações dos artistas locais.
Nos anos 70 fundei com alguns amigos o Clube da Editora Juvenil, mais tarde
conhecido como Centro de Pesquisa e Comunicação de Massa. Na época publicávamos
o fanzine Na Era dos Quadrinhos com estudos e pesquisas sobre quadrinhos,
charges, caricaturas, desenhos de humor. Mais tarde essas pesquisas foram
publicadas semanalmente na grande imprensa. Mas era pouco para ajudar os
artistas gráficos.
Resolvemos realizar exposições em escolas,
galerias de artes e shoppings seguindo de palestras para acentuar mais os trabalhos
de nossos artistas. E finalmente quando passei a editar os cadernos de cultura
da imprensa baiana resolvi abrir espaço para as tiras da Bahia. Essa
valorização foi seguida por outros jornais. Na época muitos jovens só se
interessavam em criar personagens super poderosos, voadores, super heróis
imitações dos norte americanos.
Mas havia um grupo que se destacava para
outras criatividades. Nildão, Setúbal, Lage, Cedraz, Dílson Midlej, Aps entre
outros estavam nessa leva de criadores. Com o tempo fui me afastando dos
quadrinhos (depois de publicar dois livros sobre o assunto) e fui me dedicar em
outras artes (cinema, literatura, poesia, música, artes plásticas), mas sempre
procurava me atualizar com os quadrinhos.
Cedraz seguiu no foco dos quadrinhos infantis
– era uma paixão que ele não deixaria nunca. Saindo do pequeno município de
Miguel Calmon, passando por Jacobina até chegar em Salvador ele passou por
diversos obstáculos, muitas barreiras, mas sempre com fé naquilo que fazia. E
isso é notável em sua trajetória. Um guerreiro, nada desanimava o rapaz, por
mais que as portas se fechavam para ele, outra se abria. Seus quadrinhos
começaram a ter maior visibilidade quando ele partiu para divulgar no interior
do estado, depois em outras localidades. Um de seus livros, Turma do Xaxado –
Volume 2, foi incluído no Programa Nacional Biblioteca na Escola onde o governo
federal distribuiu nas escolas dos ensinos fundamental e médio.
O criador da Turma do Xaxado, Zé Bola,
Joinha e tantos outros personagens foi um desbravador de sonhos. Antônio Luis
Ramos Cedraz foi o quadrinista mais conhecido da Bahia, nosso porto seguro,
nossa identidade deste mundo globalizado. Com ele nunca vamos perder nossas
raízes, pois ele fala a língua de sua gente simples e humilde. Ele estava no
mercado há mais de 40 anos, sempre batalhando, lutando para abrir espaço para
os quadrinhos nacionais, mas com muita humildade. Nunca desistiu da luta, mesmo
que batalhasse com dificuldades e enfrentando o todo poderoso syndicate norte
americano.
Da simplicidade do traço à criatividade da
narrativa, Xaxado retrata a vida rural com todas as suas lendas e mistérios.
São aventuras de um garoto, neto de um famoso cangaceiro que vivia com o bando
de Lampião, às voltas com problemas do dia a dia, junto com seus pais e amigos.
A Turma do Xaxado reúne personagens
tipicamente brasileiros e já recebeu diversos prêmios. Todo o trabalho tem um
bom acabamento visual das personagens, com precisão no traço e originalidade
temática. Através de um enredo fluente, falando de um cotidiano em que se
misturam o real e o simbólico, o objetivo e o subjetivo, o autor constrói uma
atmosfera da qual é difícil ficar alheio. Através de Xaxado penetramos no
universo gráfico de Cedraz, o imaginário infantil cria asas e viaja na mente de
todos nós.
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