19 junho 2006

Manifestações baianas registradas em livro


No período de 1997 até 2003 a TV Educativa exibiu a série Bahia Singular e Plural. As cores, danças e músicas das tradições populares da Bahia foram ao ar em rede nacional. Trata-se do maior registro audiovisual já realizado na Bahia, com depoimentos de artistas e especialistas, enfocando manifestações como as burrinhas (animam festas de diferentes regiões), nego fugido (simula a luta pela libertação dos escravos na perspectiva dos negros), ternos e folias de reis (ritualizando a visita dos três reis magos ao menino Jesus), mastros sagrados e profanos (tronco de árvore transformado num mastro que, acompanhado por uma banda de pífanos, é colocado em frente a uma igreja, com uma bandeira que representa o padroeiro do lugar), folguedos de Santa Brígida, caretas e zambiapunga. A série é singular porque é especial e única, tratando o individual e respeitando as particularidades e, ao mesmo tempo, é plural, porque contempla o todo e respeita a diversidade.

Esta série serviu como base para a dissertação de mestrado feita pelo jornalista Josias Pires Neto no Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da UFBa. Josias foi o responsável pela direção de 16 dos 18 episódios que foram ao ar. Esse trabalho foi transformado em livro, intitulado Bahia Singular e Plural – Registro audiovisual de folguedos, festas e rituais populares. Dividido em três capítulos de 217 páginas, o trabalho revela a força de uma cultura que não está na mídia.

O primeiro capítulo denominado Caminhos do Imaginário nos Pequenos Mundos da Bahia, aborda cultura popular, folclore e identidade nacional e um novo olhar sobre as culturas populares. Está dividido em três seções. Na primeira mostra a força do imaginário entre nós, na segunda seção verifica-se o modo como parte do imaginário passa a ser caracterizado como folclore, e na terceira introduz-se a reflexão das manifestações nos planos do material e do simbólico e ao seu contexto sócio-cultural.

Já o segundo capítulo, Antecedentes: Idéias na Cabeça e Câmera na mão, o autor fala da produção televisiva regional e identidade visual. Fala dos primeiros documentários, as burrinhas da Bahia - um folguedo com traços característicos, uma vez que está desgarrado da manifestação do bumba-meu-boi. O especial trata dos personagens que participam das festas de reis - entre os dias 1º e 6 de janeiro - e das burrinhas carnavalescas. Ao ser escolhido como o programa de estréia, a coordenação do projeto também presta uma homenagem ao artista plástico Carybé, que criou a marca da série, simbolizada por uma burrinha.

No terceiro e último capítulo, Viagem ao Sertão de Carinhanha registra relatos orais dos mestres e mestras de folguedos, captados pelas câmeras da TVE no município de Carinhanha, cidade do médio São Francisco. São abordados temas como aldeia de caboclos e mitologia das águas, irmandades e folias da bandeira, evocando os santos e do campo à tela

Foram gravados manifestações em 55 municípios, o que representa 15% do estado da Bahia. Esses programas exibidos na TVE e motivo de análise no livro de Josias rendeu também a realização de oito CDs coordenados pelo maestro Fred Dantas. Tem muito mais para se mostrar da Bahia. Vamos aguardar novos episódios da série.

O autor observa que no litoral baixo sul (Valença, Taperoá, Nilo Peçanha, Cairu) existem as manifestações de zambiapunga, enquanto mais ao sul do estado verifica-se uma curiosa disseminação de folguedos em termo da devoção a São Sebastião, que inclui ternos de Reis de São Sebastião, as puxadas de mastro e as embaixadas dramáticas conhecidas das lutas de Cristãos e Mouros ou Corte de Cristãos e Mouros. E as manifestações culturais se espalham em toda a Bahia. Da Bata de Feijão em Serrinha, Terno de Pastorinhas em Conceição do Coité, Dança Piegas em Valente, Lindroamor em Irará. Banda de Pífanos em Uauá, Nego Fugido em Santo Amaro da Purificação, Bacanarteiros em Santa Brígida, Marujada em Paratinga, Traça-fita em Rio de Contas, Chegança cem Cairu, samba de roda da Boa Morte em Cachoeira, Bumba meu boi em Boninal, festa de Chula em Piritiba, toré dos Kiriris em Banzaê, samba coco em Castro Alves, repentistas em Nazaré, cantos de café cem Amargosa e caretas de Praia do Forte em Mata de São João.

O livro de Josias Pires Neto valoriza ainda mais a produção de artistas anônimos, preservando tradições que, por estarem à margem da industria cultural, correm o risco de desaparecer. A série Bahia Singular e Plural ofereceu ao público baiano a possibilidade de redescobrir, por meio de ondas eletrônicas de rádio e tv, a riqueza e a diversidade da cultura popular tradicional espalhada por todo o interior do estado. E agora é publicado em livro.

“Durante os contatos com os mestres dos folguedos, festas e rituais religiosos populares da Bahia, pudemos perceber que essas manifestações culturais contribuem para a formação ética e estética das pessoas envolvidas com a sua produção, ajudando a elevar a auto-estima tanto do brincante como do grupo social no qual ele está inserido, contribuindo com a afirmação de identidades locais e fortalecimento da cidadania”, revelou Josias em sua obra.

2 comentários:

Anônimo disse...

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