11 janeiro 2011

A hora e vez dos quadrinhos baianos (05) (yes, nos temos quadrinhos)

Reprimida em determinados momentos políticos, indesejada como elementos de sátira, a caricatura, o desenho de humor surgido com a chegada da Família Real já revelava grandes artistas. O humor gráfico sempre teve força na vida baiana, ao dar as mais variadas interpretações à nossa realidade. Desde que a imprensa foi instalada no Brasil, a caricatura, que antes era divulgada em pranchas (semelhantes aos atuais posters), constituiu-se num elemento importante nas disputas sociais e políticas.


Antes de aparecer graficamente, a caricatura brasileira já se apresentava verbalmente com o baiano frei Vicente do Salvador (1564), que satirizava a máquina burocrática que entravava a administração do país desde o início da colonização. Gregório de Mattos Guerra, o Boca do Inferno, também ironizou verbalmente a nobreza contemporânea. Lulu Parola foi outro importante crítico de nossa sociedade.

7. OS PIONEIROS

Nos jornais humorísticos do século XIX, quase sempre em formato tabloides, eram contadas histórias através de desenhos, impressos apenas num dos lados e,m geralmente numeradas – o que era útil para o caso de ser uma série e vital para o colecionador. Os desenhistas H.Odilon, J.Cardoso, Gavarni e Fortunato Soares dos Santos eram os mais destacados. No período de 1880 a 19000 a Bahia publicava mais de 50 periódicos humorísticos de pequeno formato e curta duração. Entre eles estão O Faísca, O Satanaz, A Troça, O Neto do Diabo, O Papagaio, Foia dos Rocêro e D.Ratão.


Nomes como Manoel Paraguassu, K-Lunga, Nicolay Tischenko, Sinésio Alves, Fernando Diniz e muitos outros fixaram em seus traços usos e costumes sociais e políticos. Ao longo da história, o crítico do lápis sempre esteve presente. Assim, pode-se conhecer a história de qualquer país através do desenho de humor, da caricatura, da charge. Impiedosos ou amenos, os cartunistas com três ou quatro riscos numa folha em branco são capazes de retratar toda uma época.


O que muitos não sabem é que a maioria dos grandes nomes da pintura realizou-se primeiro no desenho, na gravura. Relegar a obra gráfica desses artistas a um segundo plano é desconhecer por completo os caminhos percorridos, muitas vezes com maior acerto e determinação do que na obra pictórica. O mestre Raimundo Aguiar, ou K-Lunga, foi um exemplo. Até hoje somente a sua pintura foi considerada. Sua obra gráfica, de interesse ilimitado, permanece em um segundo plano, cercado por um silêncio constrangedor. O mesmo podemos dizer dos trabalhos de Nicolay Tischenko, Sinézio Alves, Fernando Diniz, Álvaro de Barros entre outros. Há nos desenhos desses humoristas uma preocupação em retratar o homem no seu cotidiano, sua vida social.


Paraguassú, um nome conhecido e apreciado nas fases de sua evolução artística como desenhista, caricaturista, pintor e, finalmente, aquarelista. Especialista em portrait-charge (caricatura individualizada de personagens célebres), foi nesse gënero que obteve os primeiros triunfos de sua carreira. O lápis do artista apanhou com rara felicidade, os perfis de pessoas destacadas na política, no comércio e nas indústrias da nossa terra. Ele não lisonjeia, nem adula os seus modelos. É comedido, porém não lhes perdoa o lado cômico, ou mesmo levemente ridículo. Publicou seus trabalhos nas revistas baianas A Renascença, Única, A Fita, Artes & Artistas e na carioca Revista da Semana, além dos jornais A Tarde, Diário da Bahia, O Imparcial e Diário de Notícias.


A vida artista de Raymundo Aguiar começou como caricaturista do jornal A Tarde em 1917, seguindo das revistas Cegonha e Renascença. A partir do dia 10 de dezembro do mesmo ano Aguiar iniciou a campanha contra o governador Antonio Muniz tendo a charge Cobrindo Estátuas levado a gazeta A Hora aos tribunais, e uma outra, Transformações empastelado o jornal. Ele satirizou políticos, personalidades e costumes, e como defendia sob o pseudônimo de K-Lunga a Revolução de 30, foi parar num xadrez. De modo geral, emprestou o valor de seu lápis aos maiores jornais e revistas locais. Como caricaturista, trabalhou ainda nos jornais O Imparcial, Jornal de Notícias, A Noite e nas revistas A Luva, A Fita, A Garota, A Farra, Melindrosa, Revista da Bahia e Única.

Os primeiros trabalhos do russo Nicolay Tishchenko foram publicados na Europa, mas foi na Bahia que ele dedicou quase toda a sua vida ás charges e ilustrações. No início não entendia o coloquialismo do nosso idioma, mas seu traço forte se destacava logo nas charges que foram publicadas no jornal A Tarde. Tishchenko aos poucos foi conhecendo nossa cultura, nossa politica e idioma. Preferiu a charge á caricatura pois inspirava mais o riso do que o temor. Nos 16 anos que trabalhou n´A Tarde (1958-1975), Tishchenko ajudou, com suas charges, a perceber as ambiguidades da condição humana, as contradições disfarçadas, os anseios e insatisfações. Seu traço vivo, forte fixou nossos tipos, usos e costumes sociais e políticos, dando às suas figuras um “décor” próprio.


Fernando Diniz, um caricaturista de tipos. Suas caricaturas estão inteiramente ligadas ao universo cultural baiano, notadamente o literário, mas por vezes fixando vultos da política e do jornalismo, das artes e do magistério em charge e portraits-charges característicos, não raro também incursionando nas esferas nacional e internacional, quase todos acompanhados dos respectivos textos rimados (os epigramas). Diniz publicou caricaturas nas revistas América, Única e Festa e no jornal A Tarde. Em seu trabalho destaca-se a crítica corretiva, ainda que corrosiva, da sociedade ou do indivíduo, coexistindo o traço e o verso chistoso que se completam. Participou do Pavilhão de Humor do Canadá, em 1968.


Sinézio Alves foi o mais completo criador popular da Bahia, ficando conhecido desde o tempo das silhuetas cortadas, recortadas e picotadas das concorridas Feiras de Amostras da década de 1960 até as suas caricaturas políticas que, quando censuradas pelos leitores do Estado Novo, corriam de mão em mão, de casa em casa, no trânsito mágico da liberdade. Como caricaturista, incomodou interventores, governadores, prefeito, os figurões da política e da sociedade. Mas também reverenciou, com sutil ironia, poetas, pintores, cordelistas e romancistas. Raros são os livros de cordel que não trazem sua assinatura. A irreverência de seu traço percorreu os jornais baianos A Tarde, Diário da Bahia, Diário de Notícias, O Imparcial, A Crítica e a Fóia dos Rocêro.

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Estamos publicando, em 23 artigos, a hora e vez dos quadrinhos baianos.
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Um comentário:

Anônimo disse...

Olá Gutemberg!!

Sou Adriana, estudante do mestrado em História da Ufba e pesquiso sobre o humor na Bahia no final do século XIX. Suas matérias sobre humor gráfico têm sido muito importantes.

Gostaria de saber onde posso encontrar mais informa sobre o caricaturista Fortunato Soares dos Santos e sobre os jornais de humor do século XIX.

Desde já agradeço sua colaboração!