03 fevereiro 2009

Grafite: dos muros às galerias (1)

No início, o grafite era apenas um prazer, um deboche, uma aventura. Mas depois afinou o traço e passou dos muros às galerias. No início dos anos 70 o metrô de Nova Iorque foi tomado de assalto por figuras e pichações. Essa mesma moda também deslumbrou os moradores de Berlim Ocidental com diversos desenhos. A Europa e os Estados Unidos foram inundados pela chamada Street Art. Foi-se o tempo do grafite restrito às ruas. A linguagem do spray conquistou galerias e museus, enfrentando o desafio de manter a vibração e a atmosfera transgressora dos desenhos feitos em espaços ao ar livre.

Por ser um fenômeno essencialmente urbano o grafite aterrizou no Brasil e ganhou impulso em São Paulo. A princípio eram desenhos curiosos e frases tímidas. Mas aos poucos a timidez passou e a cidade foi sendo invadida por ferozes garranchos que trouxeram para os muros devaneios antes restritos aos banheiros masculinos. Mas nem tudo que está no muro é grafite, como tampouco pode ser chamado indiscriminadamente de pichação. Os dois movimentos começaram juntos e foram confundidos, mas são diferentes na essência. Apesar de usarem o mesmo cenário, as ruas, não têm o mesmo significado e sequer os mesmos autores. Pichação é qualquer frase largada meio de improviso pelos muros. É propaganda política ou uma simples mensagem do tipo “Te amo Maria”. Já os grafites são desenhos ou mesmo apenas frases, mas feitas com cuidado, engenho e substância. Assim, um simples trocadilho como “Amar eternamente. Amar é ter na mente. Amar éter na mente” se torna um grafite pela espirituosidade de seu criador.

Grafite é diferente de pichação.

Segundo Celso Gitahy em seu livro O Que é Grafiti (Editora Brasiliense), tanto o graffiti como a pichação usam o mesmo suporte – a cidade – e o mesmo material (tintas). Assim como o graffiti, a pichação interfere no espaço, subverte valores, é espontânea, gratuita, efêmera. Uma das diferenças entre o graffiti e a pichação é que o primeiro advém das artes plásticas e o segundo da escrita, ou seja, o graffiti privilegia a imagem; a pichação, a palavra e/ou a letra. Para o escritor Norman Mailer, o fenômeno do graffite é uma rebelião tribal contra a opressora civilização industrial.

Interferir, apropriar, intervir são verbos intimamente ligados à arte do grafite. Em 1076 o artista Alex Vallauri dava seus primeiros passos no grafite. Em 1985 ele participa da 18 Bienal de São Paulo com sua Casa da Rainha do Frango Assado. Daí por diante os grafiteiros passaram a dividir o tempo entre intervenções nas ruas, exposições em galerias e até mesmo grafites por encomenda. O movimento foi exportado de São Paulo para outros estados.

O grupo Tupinãodá participou, na época, do Projeto Pinta no Rio, da Rioarte, idéia do cartunista Lapi que convidou artistas plásticos para colorir os muros da cidade. Em Salvador, Renato da Silveira e Nildão juntos desde o início dos anos 80e seus grafites, sempre bem-humorados, acabaram sendo reunidos no livro Quem Não Risca Não Petisca. Em Recife, a prefeitura abriu espaço para os grafiteiros e até doou tintas. Nildão foi grafiteiro que saiu dos quadrinhos, fez arte nos muros, coordenou o espaço cultural Rana, depois virou designer.

Keith Haring e Jean Michel Basquiat, graffiteiros do metrô nova iorquino, tornaram-se conhecidos no mundo inteiro. Keith Haring levou o graffiti para o convívio de galerias, museus e bienais. Na França, Alemanha, Itália e Londres o picture-graffitii já se espalhava em todos os cantos. No Brasil as letras coloridas junto com desenhos elaborados, partindo de várias técnicas, também começaram a se destacar. Os desenhos traduziam o universo hip hop em suas mais variadas nuances, como figuras humanas dançando, pensando, cantando...em movimento.


Para muitos, grafite é arte e pichação não. Grafite embeleza, pichação não. Enquanto grafite é elaborado, aplicado, bem, feito, a pichação é um gesto transgressor, impõe, na paisagem urbana, uma vibração insubordinada, uma urgência interna e visceral. Dizer que grafite é arte superior é visão preconceituoso. Basta lembrar que arte nem sempre é limpinha, ordenada. Muitas vezes é um caos artístico.

Um comentário:

Lari Araujo disse...

Valeu pela ajuda no meu trabalho!!
:3