04 março 2008

Giordano Bruno e seus furores (2)

Em 1584, são publicadas as suas obras principais (“O Banquete das Cinzas”, “A Causa, o Princípio e a Unidade”, “Do Infinito, do Universo e dos Mundos”), nas quais expõe uma visão cosmográfica revolucionária, quase visionária. Refuta a velha concepção do geocentrismo e apóia a representação do mundo de Copérnico (heliocentrismo), excedendo-a: “o universo é infinito, povoado por uma multiplicidade de mundos análogos ao nosso”. Concebendo um mundo aberto, que sempre existiu e que sempre existirá, Bruno dá um salto na imensidão. Contudo, permanece ancorado no seu tempo, acrescentando às suas intuições geniais credos herméticos, mágicos e animistas. Sua audácia atinge um ponto culminante com a publicação de “Os Furores Heróicos”, no qual defende a idéia de um mundo desprovido de centro, em que Deus não tem lugar.

Monista, muito mais do que os outros naturalistas, identificou Deus com a substância do universo. Negou a existência de uma esfera exterior a este nosso mundo; este, uma vez identificado com a divindade, devia ser infinito, e em decorrência se podia imaginar outros e outros mundos, com os respectivos sóis. Em Bruno se refletem as doutrinas panpsiquistas do seu mestre Francesco Patrizzi. A matéria é por si mesma princípio de movimento, dela emanando todas as formas. Concebeu as coisas conforme o atomismo de Demócrito, influenciado entretanto pela imagem neoplatônica do mundo com riqueza imanente. .

INDEPENDENTE - No século XVI a filosofia se liberta da religião, e a ciência moderna nasce da filosofia. A ciência não mais será a busca da verdade na propriedade lógica de conceitos, mas através das lentes de microscópios e telescópios. Bruno é a figura principal nessa transição: torna-se um filósofo independente e pressente que a verdade está para além do autoritarismo lógico dos filósofos escolásticos. Embora não seja um cientista, pois não era nem matemático nem astrônomo, dá prontamente crédito a Copérnico, um observador do céu e do movimento dos astros. Copérnico ousa contrariar a cosmologia das esferas celestes perfeitas do sistema aristotélico-ptolomaico que tomava a terra, "logicamente", como o centro do universo.

Sua idéia de que o universo era infinito, e que muitos mundos deveriam existir além daquele então conhecido foi uma das grandes idéias estimuladoras da ciência, durante o Renascimento. O seu livro "Sobre o Universo Infinito e Mundos" em que faz sua afirmação da existência de outros mundos povoados por seres inteligentes é ainda hoje um grande apelo para a imaginação de muitos. Sua técnica de classificação sistemática de objetos da observação no preenchimento de tabelas, suas tábuas combinatórias, foram o germe os métodos empíricos que marcaram o início da ciência experimental.
PIONEIRO - Ele foi um pioneiro que acordou a Europa de seu sono intelectual e foi martirizado devido ao seu entusiasmo. A morte de Bruno pairou sobre as ações da Igreja Católica um medo sombrio. Viram-na como uma instituição capaz de perseguir os doutos e os sábios caso eles ameaçassem a autoridade do Alto Clero e da burocracia papal. Imagem negativa que só o Papa João Paulo II tratou de mandar reparar ao desculpar-se pela infelicidade do processo contra Galileu, reabilitando-o em 1992. Mas ainda não tomou uma decisão favorável a Giordano Bruno. A Igreja Católica só deplorou a execução, mas não os motivos da sua condenação.
Giordano elegeu a liberdade de pensamento como a única estância a que o homem pode e deve submeter-se. Nesse sentido, reproduz o espírito do Alcorão quando afirma que a inteligência humana é infinita e, assim, não pode aceitar a submissão a verdades absolutas, por ser incoerente com a natureza humana. Ele foi capaz de detectar a natureza irracional dos conflitos teológicos-políticos-filosóficos, clamando à razão, o humano, por isso, foi queimado vivo. Cinco séculos se passaram e o homem individual ou coletivo ainda permanece submetido a poderes hierárquicos, abstratos, extra-terrenos, cimentados na fé reencarnacionista da matéria e na qualidade do sangue, sob a égide de mandatários ocultos que atuam como mandrakes das histórias em quadrinhos. É traumática a servidão humana e inaceitável a preguiça em assumir os próprios passos, sem interventores ou feitores, responsabilizando-se por suas ações e omissões perante as próprias consciências.

Um comentário:

Giordano SDB disse...

Senhor, gostaria de indicação de e sua ajuda sobre a obra: Eroici furori, para uma comunicação que irei apresentar em breve sobre Giordano Bruno, o senhor poderia me ajudar?