Ele
negou o título de porta-voz de uma geração, foi elétrico quando ser elétrico
era sinônimo de adolescência, se isolou no campo quando o movimento hippie veio
bater à sua porta, não teve medo de expor seus sentimentos e ansiedades numa
persona arredia, canta – até hoje – as mesmas músicas cada hora de um jeito
diferente. Considerado o maior poeta do rock, suas músicas serviram de trilha
sonora para os movimentos civis dos anos 60 e suas letras foram fundamentais
pra que o rock and roll amadurecesse. Nomes essenciais do estilo, como os
Beatles, os Rolling Stones e Jimi Hendrix, jamais esconderam sua admiração pelo
artista.
Ele veio ao mundo em 24 de maio de 194, há
80 anos. Cantor considerado a voz de uma geração. De cantor de folk a ícone de
rock, de manifestante político a letrista mais do que reconhecido talento que
lhe rendeu, em 2016, o Prêmio Nobel de Literatura por sua obra poética na
música popular americana. Ele foi um dos personagens centrais na luta pelos
direitos civis nos anos 60, ajudou o rock a entrar na maturidade e se tornar o
principal gênero musical da segunda metade do século passado, misturou alta e
baixa cultura em letras que citavam a Bíblia, Shakespeare e os beats, expandiu
a duração da música pop, fez a country music amadurecer e reabilitou Johnny
Cash, apresentou maconha aos Beatles, duvidou (várias vezes) da religião, da
cultura de seu tempo e dos próprios fãs. Judeu de Minnesota fez sucesso entre
os intelectuais nova-iorquinos.
Seu nome verdadeiro é Robert Allen
Zimmerman, nasceu em Duluth, em 1941, mas cresceu na pequena cidade de Hibbing,
no estado do Minnesota. Depois de se mudar para Nova Iorque aos 18 anos, ele
lançou seu primeiro disco em 1962. Uma de suas maiores inspirações foi o cantor
Woodie Guthrie, que direcionou os primeiros anos de sua carreira para músicas
de inspiração folk e cunho político.
No início da carreira Dylan mesclava sua
voz rasgada com uma gaita imponente. Suas canções de protesto levaram jovens à
reflexão sobre a sociedade e política da época. Ele tirava do noticiário dos
jornais e da TV a matéria-prima para suas canções, falava a linguagem que a
juventude em “guerra” nas universidades queria ouvir. Um crítico do New York
Times aposta naquela “mistura de menino-de-coro e beatnick” e cria o rótulo
“canção de protesto”, que passa a ser sinônimo do trabalho de Dylan. O estouro
de “Blowin’in the Wind” consolida essa imagem.
O terceiro disco saiu em 64, e mantinha a
linha política inclusive no nome: “The Times they are A’Changing”. Junto com
Joan Baez, lidera o movimento de rebeldia. No quarto disco, ele quebra com a
imagem de garoto pré-fabricado e passa a fazer composições autobiográficas. O
público considera a virada em seu trabalho uma traição, suas letras não são
mais compreendidas facilmente, ele exacerba o lado surrealista da poesia, faz
longas digressões, fala da incompreensão dos homens pelo que fazem e ao se
apresentar em l965 no mesmo festival de Newport é vaiado. Na verdade Dylan faz
nova revolução musical, quando se apresenta acompanhado pelas guitarras
elétricas do The Band: uma heresia para a folk music. A imprensa imediatamente
cria um novo nome para aquele som: folk rock. Nasce logo em seguida a música
que os Birds iriam consagrar como a primeira psicodelic song, “Mr. Tamborim
Man”.
Depois disso Dylan sai com uma série de
trabalhos — “Subterranean Homesick Blues”, “Like a Rolling Stone”. Em 1968
surpreendeu o público e a crítica com o álbum John Wesling Hardin, fortemente
influenciado pelo country, tendência que se acentuou no trabalho seguinte,
Nashville Skyline, e trouxe o clássico Lay Lady Lay para as paradas. O que
produziu no início dos anos 70 não foi bem recebido pela crítica, considerado
muito abaixo de seus melhores momentos. Retorna a evidência e ao sucesso,
principalmente pelo elogiado duplo ao vivo Before the Flood (1974), além de Blood
On Tracks (1975) e Desire (1976), seus melhores discos nos anos 70, aclamados
pela crítica. Deste último, a canção Hurricane, baseado na história de Rubin
Carter, um boxeador negro preso injustamente, foi um sucesso espetacular, ao
mesmo tempo que a turnê Roling Thunder Revue (75/76) era aclamada por crítica e
público.
Após seu divórcio em 1977, da esposa Sara
Lownes, com quem era casado desde 1965, Dylan viveu uma grande crise pessoal,
que refletiu-se em seu trabalho artístico. Depois de uma turnê mundial em 1978,
em parte registrada no duplo ao vivo At Budokan (gravado no Japão), ele
voltou-se para a música gospel, após converter-se ao cristianismo e filiar-se a
uma igreja. Foi o período mais controverso e polêmico de sua carreira,
principalmente por Dylan afastar-se de seu repertório clássico e investir em
canções com temática cristã. Nesta nova fase, surpreendeu seus antigos fãs e se
aproximou de músicos do segmento cristão, como Larry Norman, Chuck Girard e
Keith Green. Dylan gravou três álbuns: Slow Train Coming (1979) considerado o
mais inspirado dos três, deu a Dylan um Grammy de melhor vocal masculino, pela
canção Gotta Serve Somebody. O segundo álbum, Saved (1980), teve uma recepção
menos entusiasmada, embora na opinião de Kurt Loder da Rolling Stone este álbum
fosse superior ao primeiro. Shot of Love (1981) encerra a fase cristã de Dylan.
Em 2003 representantes da música
afro-americana estavam em The Gospel Songs of Bob Dylan, um CD que se desdobrou
em indicação para o Grammy e em documentário (2006) sobre esta fase. O jornal
International Herald Tribune declarava que a interpretação afro-americana
levava a música de Dylan a um outro patamar. Anos 80 Com Infidels, de 1983,
Dylan afasta-se da fé cristã, volta-se inesperadamente para as suas raízes
judaicas e parece reencontrar certo equilíbrio artístico. Bem recebido pela
crítica, é considerado seu melhor álbum desde Desire.
Down In The Grovy, álbum de 1988, passou
despercebido, contém várias covers, mas equivale a uma declaração de
princípios, com canções de folk-rock, gospel, rock, que demarcam os gostos
artísticos preferenciais do artista. Depois de uma turnê com a lendária banda
californiana Grateful Dead, ele lança o álbum Oh Mercy (1989), elogiado pela
qualidade inesperada das canções e volta às paradas com o super-grupo Traveling
Wilburys, formado com os amigos George Harrison, Tom Petty, além de Jeff Lynne
e Roy Orbison.
No início dos anos 90, Bob Dylan volta a
gravar folk tradicional, acústico, sem importar-se com o pouco apelo comercial
deste gênero nos dias atuais. Depois do acústico produzido para a MTV em 1994,
Dylan só voltaria com um CD de inéditas em 1997. O álbum Time Out Of Mind ganharia vários
prêmios Grammy e foi considerado por muitos uma nova ressurreição artística,
confirmada pela qualidade de Love and Theft (2001). No documentário No
Direction Home, de Martin Scorsese, que flagra os anos iniciais de sua carreira
(1961-1966) e com Modern Times, seu álbum lançado em 2006, com o qual, pela
quarta vez na carreira, Dylan conquistou a liderança do ranking dos mais
vendidos dos Estados Unidos, vendendo 192.000 cópias na primeira semana. A
última vez que Dylan tinha alcançado a liderança nos Estados Unidos, foi com o
álbum Desire, de 1976, que ficou 5 semanas no topo das paradas.
Em 2012, o então presidente dos Estados
Unidos, Barack Obama concedeu a Bob a Medalha da Liberdade, considerada a maior
honra civil do país, que é concedida para as pessoas que fizeram contribuições
para os interesses nacionais americanos. Em outubro de 2016, o artista foi
agraciado pela Academia Sueca com o Prêmio Nobel de Literatura, por “ter criado
novos modos de expressão poética no quadro da tradição da música norte-americana”.
Além deste, ele também é vencedor de Oscar, Grammy e Globo de Ouro, sendo o
primeiro artista da História a receber tantos prêmios por sua obra.
A voz rouca da discórdia nunca esmoreceu.
É interpretado por uma diversificada gama de músicos que vai da cantora pop
Sheryl Crowe ao brasileiro Zé Ramalho, do reggae de Bob Marley ao rock dos
Rolling Stones ou a MPB de Caetano Veloso (além da banda mineira Skank que fez
uma versão da canção I want you, de Dylan, intitulada Tanto). A sua música é
interpretada por vozes delicadas como Gal Costa e Joan Baez, e também funciona
perfeitamente bem em versões roqueiras de bandas como os Byrds, Guns´n Roses ou
de Neil Young.
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