24 maio 2021

Bob Dylan comemora 80 anos

 

Ele negou o título de porta-voz de uma geração, foi elétrico quando ser elétrico era sinônimo de adolescência, se isolou no campo quando o movimento hippie veio bater à sua porta, não teve medo de expor seus sentimentos e ansiedades numa persona arredia, canta – até hoje – as mesmas músicas cada hora de um jeito diferente. Considerado o maior poeta do rock, suas músicas serviram de trilha sonora para os movimentos civis dos anos 60 e suas letras foram fundamentais pra que o rock and roll amadurecesse. Nomes essenciais do estilo, como os Beatles, os Rolling Stones e Jimi Hendrix, jamais esconderam sua admiração pelo artista.

 

 


Ele veio ao mundo em 24 de maio de 194, há 80 anos. Cantor considerado a voz de uma geração. De cantor de folk a ícone de rock, de manifestante político a letrista mais do que reconhecido talento que lhe rendeu, em 2016, o Prêmio Nobel de Literatura por sua obra poética na música popular americana. Ele foi um dos personagens centrais na luta pelos direitos civis nos anos 60, ajudou o rock a entrar na maturidade e se tornar o principal gênero musical da segunda metade do século passado, misturou alta e baixa cultura em letras que citavam a Bíblia, Shakespeare e os beats, expandiu a duração da música pop, fez a country music amadurecer e reabilitou Johnny Cash, apresentou maconha aos Beatles, duvidou (várias vezes) da religião, da cultura de seu tempo e dos próprios fãs. Judeu de Minnesota fez sucesso entre os intelectuais nova-iorquinos.

 

Seu nome verdadeiro é Robert Allen Zimmerman, nasceu em Duluth, em 1941, mas cresceu na pequena cidade de Hibbing, no estado do Minnesota. Depois de se mudar para Nova Iorque aos 18 anos, ele lançou seu primeiro disco em 1962. Uma de suas maiores inspirações foi o cantor Woodie Guthrie, que direcionou os primeiros anos de sua carreira para músicas de inspiração folk e cunho político.

 

No início da carreira Dylan mesclava sua voz rasgada com uma gaita imponente. Suas canções de protesto levaram jovens à reflexão sobre a sociedade e política da época. Ele tirava do noticiário dos jornais e da TV a matéria-prima para suas canções, falava a linguagem que a juventude em “guerra” nas universidades queria ouvir. Um crítico do New York Times aposta naquela “mistura de menino-de-coro e beatnick” e cria o rótulo “canção de protesto”, que passa a ser sinônimo do trabalho de Dylan. O estouro de “Blowin’in the Wind” consolida essa imagem.

 


O terceiro disco saiu em 64, e mantinha a linha política inclusive no nome: “The Times they are A’Changing”. Junto com Joan Baez, lidera o movimento de rebeldia. No quarto disco, ele quebra com a imagem de garoto pré-fabricado e passa a fazer composições autobiográficas. O público considera a virada em seu trabalho uma traição, suas letras não são mais compreendidas facilmente, ele exacerba o lado surrealista da poesia, faz longas digressões, fala da incompreensão dos homens pelo que fazem e ao se apresentar em l965 no mesmo festival de Newport é vaiado. Na verdade Dylan faz nova revolução musical, quando se apresenta acompanhado pelas guitarras elétricas do The Band: uma heresia para a folk music. A imprensa imediatamente cria um novo nome para aquele som: folk rock. Nasce logo em seguida a música que os Birds iriam consagrar como a primeira psicodelic song, “Mr. Tamborim Man”.

 

Depois disso Dylan sai com uma série de trabalhos — “Subterranean Homesick Blues”, “Like a Rolling Stone”. Em 1968 surpreendeu o público e a crítica com o álbum John Wesling Hardin, fortemente influenciado pelo country, tendência que se acentuou no trabalho seguinte, Nashville Skyline, e trouxe o clássico Lay Lady Lay para as paradas. O que produziu no início dos anos 70 não foi bem recebido pela crítica, considerado muito abaixo de seus melhores momentos. Retorna a evidência e ao sucesso, principalmente pelo elogiado duplo ao vivo Before the Flood (1974), além de Blood On Tracks (1975) e Desire (1976), seus melhores discos nos anos 70, aclamados pela crítica. Deste último, a canção Hurricane, baseado na história de Rubin Carter, um boxeador negro preso injustamente, foi um sucesso espetacular, ao mesmo tempo que a turnê Roling Thunder Revue (75/76) era aclamada por crítica e público.

 


Após seu divórcio em 1977, da esposa Sara Lownes, com quem era casado desde 1965, Dylan viveu uma grande crise pessoal, que refletiu-se em seu trabalho artístico. Depois de uma turnê mundial em 1978, em parte registrada no duplo ao vivo At Budokan (gravado no Japão), ele voltou-se para a música gospel, após converter-se ao cristianismo e filiar-se a uma igreja. Foi o período mais controverso e polêmico de sua carreira, principalmente por Dylan afastar-se de seu repertório clássico e investir em canções com temática cristã. Nesta nova fase, surpreendeu seus antigos fãs e se aproximou de músicos do segmento cristão, como Larry Norman, Chuck Girard e Keith Green. Dylan gravou três álbuns: Slow Train Coming (1979) considerado o mais inspirado dos três, deu a Dylan um Grammy de melhor vocal masculino, pela canção Gotta Serve Somebody. O segundo álbum, Saved (1980), teve uma recepção menos entusiasmada, embora na opinião de Kurt Loder da Rolling Stone este álbum fosse superior ao primeiro. Shot of Love (1981) encerra a fase cristã de Dylan.

 

Em 2003 representantes da música afro-americana estavam em The Gospel Songs of Bob Dylan, um CD que se desdobrou em indicação para o Grammy e em documentário (2006) sobre esta fase. O jornal International Herald Tribune declarava que a interpretação afro-americana levava a música de Dylan a um outro patamar. Anos 80 Com Infidels, de 1983, Dylan afasta-se da fé cristã, volta-se inesperadamente para as suas raízes judaicas e parece reencontrar certo equilíbrio artístico. Bem recebido pela crítica, é considerado seu melhor álbum desde Desire.

 

Down In The Grovy, álbum de 1988, passou despercebido, contém várias covers, mas equivale a uma declaração de princípios, com canções de folk-rock, gospel, rock, que demarcam os gostos artísticos preferenciais do artista. Depois de uma turnê com a lendária banda californiana Grateful Dead, ele lança o álbum Oh Mercy (1989), elogiado pela qualidade inesperada das canções e volta às paradas com o super-grupo Traveling Wilburys, formado com os amigos George Harrison, Tom Petty, além de Jeff Lynne e Roy Orbison.

 


No início dos anos 90, Bob Dylan volta a gravar folk tradicional, acústico, sem importar-se com o pouco apelo comercial deste gênero nos dias atuais. Depois do acústico produzido para a MTV em 1994, Dylan só voltaria com um CD de inéditas em 1997.  O álbum Time Out Of Mind ganharia vários prêmios Grammy e foi considerado por muitos uma nova ressurreição artística, confirmada pela qualidade de Love and Theft (2001). No documentário No Direction Home, de Martin Scorsese, que flagra os anos iniciais de sua carreira (1961-1966) e com Modern Times, seu álbum lançado em 2006, com o qual, pela quarta vez na carreira, Dylan conquistou a liderança do ranking dos mais vendidos dos Estados Unidos, vendendo 192.000 cópias na primeira semana. A última vez que Dylan tinha alcançado a liderança nos Estados Unidos, foi com o álbum Desire, de 1976, que ficou 5 semanas no topo das paradas.

 

Em 2012, o então presidente dos Estados Unidos, Barack Obama concedeu a Bob a Medalha da Liberdade, considerada a maior honra civil do país, que é concedida para as pessoas que fizeram contribuições para os interesses nacionais americanos. Em outubro de 2016, o artista foi agraciado pela Academia Sueca com o Prêmio Nobel de Literatura, por “ter criado novos modos de expressão poética no quadro da tradição da música norte-americana”. Além deste, ele também é vencedor de Oscar, Grammy e Globo de Ouro, sendo o primeiro artista da História a receber tantos prêmios por sua obra.

 

A voz rouca da discórdia nunca esmoreceu. É interpretado por uma diversificada gama de músicos que vai da cantora pop Sheryl Crowe ao brasileiro Zé Ramalho, do reggae de Bob Marley ao rock dos Rolling Stones ou a MPB de Caetano Veloso (além da banda mineira Skank que fez uma versão da canção I want you, de Dylan, intitulada Tanto). A sua música é interpretada por vozes delicadas como Gal Costa e Joan Baez, e também funciona perfeitamente bem em versões roqueiras de bandas como os Byrds, Guns´n Roses ou de Neil Young.

 

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