“__Você viu pra onde foi aquele negro?”, “__Vi, sim senhor. Ele virou besouro e saiu voando”. Foi assim que o apelido de Manuel Henrique Pereira surgiu e começou a correr por toda a Bahia. Nascido no antigo quilombo de Urupy, distrito de Oliveira dos Campinhos, município de Santo Amaro, em 1895, Besouro foi um dos capoeiristas mais famosos de sua época e extremamente hábil com as facas. Reza a história que quando ele nasceu, também estavam lá (e do seu lado nunca saíram), os protetores da capoeira: os orixás Ogum e Oxossi.
Depois do sucesso do musical Besouro Cordão de Ouro inspirado na vida do capoeirista com texto do compositor Paulo César Pinheiro, chegou a vez do valente que desafiava as autoridades se exibir nas telas do cinema. O publicitário brasileiro mais premiado no Festival de Publicidade de Cannes, João Daniel Tikhomiroff escolheu a história do capoeirista para estrear seu primeiro longa metragem. O filme Besouro foi rodado em Igatu, na Chapada Diamantina. Besouro será interpretado pelo ator Ailton Carmo, o Coquinho. O fotógrafo Christian Cravo (filho do renomado Mário Cravo) está preparando um livro com a fotodocumentação artística da aventura da produção do filme na Chapada Diamantina e no Recôncavo Baiano.
NA HISTÓRIA - Aos 13 anos, Besouro ganhou o mundo: saiu de casa para trabalhar e começou a escreveu seu nome na história através de suas aventuras. Foi vaqueiro e amansador de burro bravo pelas vilas do Recôncavo Baiano. Aprendeu com um tio africano e ex-escravo os mistérios da capoeira, do jogo, das facas e das boas orações. Já adulto foi também saveirista e soldado do Exército Brasileiro. O capoeirista era tão respeitado que costumava sair às ruas avisando aos comerciantes que fechassem as portas, pois tinha acabado de decretar feriado. Também era comum vê-lo presenteando um de seus compadres com penas de pavão, arrancadas dos chapéus dos valentões de Santo Amaro.
Nas rodas de capoeira do Trapiche de Baixo (até hoje o bairro mais pobre de Santo Amaro) e nas festas populares, o jovem Besouro começou a se destacar. O seu forte era a agilidade, a rapidez de raciocínio, a calma e a surpresa, além de ter o corpo fechado com fortes mandingas e rezas. Paulo Barroquinha, Boca de Siri, Noca de Jacó, Doze Homens e Canário Pardo, todos moradores do local, foram os seus companheiros nas memoráveis rodas de Capoeira que hipnotizavam quem quer que passasse. Rodas de capoeira como aquelas só são vistas de tempos em tempos e, talvez, mesmo assim, nunca se vejam outras iguais.
UMA LENDA - Besouro fez história e virou lenda. Um homem que é tido por alguns como arruaceiro, criminoso ousado, fora-da-lei e, ao mesmo tempo, é considerado por outros um justiceiro, protetor dos oprimidos. Apesar de violento, não se tem notícia de que ele tenha matado alguém. Os casos de suas façanhas são contados por pessoas antigas, algumas conviveram com ele, outras que ouviram falar de sua rebeldia. Ele vivia num mundo em que para sobreviver era preciso ter malícia dentro e fora da roda de capoeira.
O difícil é descobrir como esse homem negro e pobre nascido no fim do século XIX, numa época em que ser praticante de atividades ligadas à herança africana era considerada um crime, se tornou a figura mais respeitada no mundo da capoeira. Sua fama extrapolou os limites do Recôncavo, chegou à Salvador, ao restante do país e alcançou os quatro cantos do mundo. Capoeirista valentão num tempo em que não havia a divisão entre os estilos Angola e Regional, muito menos escolas e academias de ensino, “Besouro Cordão de Ouro”, como era também conhecido, inspirou um dos capítulos do livro Mar Morto, de Jorge Amado.
JUSTIÇA - Para alguns, Besouro desejava apenas justiça. Ele era o elemento negro injustiçado pela cultura dominante que necessitava existir pela formulação de um novo código e, ao mesmo tempo, de um novo conceito de justiça. Foi em meio a essa cultura dominante, de nobres e senhores de escravos, que o hábil capoeirista conseguiu se sobressair. Besouro morreu muito jovem, assassinado antes de completar 30 anos. O homem mais valente do Recôncavo baiano foi golpeado traiçoeiramente com uma faca de ticum (preparada especialmente para abrir seu corpo fechado pela mandinga) por um de seus colegas. Até hoje, Besouro é símbolo da capoeira em todo o território baiano, sobretudo pela sua bravura e lealdade com que sempre comportou com relação aos fracos e perseguidos pelos fazendeiros e policiais.
“Quem é você que acaba de chegar//Eu sou Besouro Preto/Besouro de Mangangá/Eu vim lá de Santo Amaro/Vim aqui só pra jogar/Quem é você que acaba de chegar/Quem é você que acaba de chegar//Eu sou Besouro Preto/Besouro de Mangangá/Ando com corpo fechado/Carrego meu patuá/Quem é você que acaba de chegar/Quem é você que acaba de chegar//Me chamam Besouro Preto/Besouro de Mangangá/Bala de rifle não me pega/Que dirá faca de matar/Quem é você que acaba de chegar/Quem é você que acaba de chegar//Aqui em Maracangalha/Você não vai escapar/Contra faca de tucum/Ninguém pode se salvar/Quem é você que acaba de chegar/Quem é você que acaba de chegar”.
3 comentários:
É uma pena que tenham deturpado a nossa história regional, quanto a capoeira e ao mestre Besouro. O filme tem uma excelente fotografia, mas, alteraram a história e o fim de besouro, pois, ele não morreu, saiu voando como diz a lenda. O filme, nas entrelinhas, privilegiou o coronealismo, afastando-se da realidade, não mostrou o que realmente Besouro foi, e fez!
Talvez...mas não me pareceu que o besouro tenha morrido...porém, de qualquer modo, gostei di filme, principalmente poe não ter atores de novela...dá a sensação, que é um filme e não uma nivela iú seriado global...
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