02 junho 2009

História da Vagina (2)

“A religião – o sistema de crenças de uma sociedade – sempre é um assunto controverso. E, ao examinar como no passado as diversas religiões viam a genitália feminina, descobri as posições mais polarizadas. De um lado, o Ocidente, com sua atitude que considera a vagina como a porta do inferno, a fonte de todos os problemas e sofrimento neste mundo, e a desgraça em potencial do homem. Aqui a vagina era algo a ser temido, ridicularizado e abominado. Entretanto, oposto a isso havia os sistemas de crença originários da Índia e da China. Estes ensinavam que a genitália feminina era a origem simbólica do mundo, a fonte de toda nova vida e a via pela qual se poderia obter longevidade e a vida eterna. Aqui a vagina era um ícone a ser venerado, amado e honrado. A divina vagina. E, caso eu não conseguia acreditar nessas palavras, havia uma abundante e bem visível arte vaginal – pintores, escultores, gravuras –confirmando que essa era a forma com que muita gente, em culturas extremamente variadas, havia concebido milhares de anos”, afirmou.

Enquanto no Ocidente a vagina é tão desvalorizada e a sexualidade feminina reprimida, a etnografia dos últimos 100 anos mostra como é diferente o que ocorre em várias outras culturas. Nas Ilhas Marquisas, Ilha de Páscoa, Ilhas do Pacífico, Polinésia, os genitais femininos são valorizados – é frequente que o clitóris, os pequenos e grandes lábios sejam manipulados e alongados artificialmente e enfeitados com piercings, tendo como objetivo sua maior capacitação para o prazer sexual. A autora termina a obra com amplas considerações sobre o orgasmo feminino.

O livro é um guia meticuloso sobre o sexo feminino. Blackledge não se poupou esforços para realçar o papel que a vagina tem na nossa vida, chamando a atenção para o fato de esse papel ter sido subalternizado durante séculos, não só devido aos conceitos morais vigentes, liderados por homens, mas também devido a uma certa cegueira científica. A Ciência ignorou muitos fatos sobre a importância da vagina já detectados pelos Antigos. Neste particular, o papel obscurantista da Igreja é notável.
Blackledge encontrou coisas curiosas, como a ligação entre chifres, fertilidade e útero. Os médicos sabem que, segundo a anatomia humana, o útero tem cornos. Diz a autora: “A associação entre um homem corneado e chifres prevalece em toda a Europa meridional. Em português (cornudo ou cabrão), em espanhol (cornudo), em catalão (cornut ou cabroni), em francês (cocu) e em grego (ketatas), a palavra para a pessoas corneada quer dizer ´o que foi corneado´ ou áquele que transporta chifres´ (...) E significativo que esse termo que transporta a homen, nunca a mulheres”.

A autora procura também decifrar o significado das palavras relacionadas com a vagina, dedica páginas e prazeres ao clitóris. O papel da vagina na relação sexual é bem destacado pela autora, e da exemplos curiosos: “O escritor francês Gustave Flaubert refere-se\com entusiasmo aos seus encontros com as prostitutas profissionais exiladas na cidade egípcia de Esneh: ´a sua cona ordenhahava- me como rolos de veludo – eu enlouquecia”.
Através do mundo, Shilihong era uma profissional de sexo de Xangai famosa pelo seu excepcional controle dos músculos vaginais. Consta que era capaz de movimentar o pênis do homem para dentro e para fora, simplesmente contraindo e relaxando os seus músculos, movimento que produzia uma sensação de sucção. Diz-se igualmente que a “chupeta de Xangai”, de Wallis Simpson, foi um dos motivos pelo qual a Grã-Bretanha perdeu um rei em 1936. Comentava-se que a Sra. Simpson conseguia que um palito de fósforo se sentisse um charuto de Havana.
A importância do cheiro para as relações bem sucedidas não foi esquecida na obra. Quando uma mulher diz “este tipo não me cheira”, é natural que a relação não avança. O chamado ponto G (aquele que, estimulado, provocaria, o orgasmo da mulher) e outros são abordados sem subterfúgios. Dessa forma Catherine Blackledge contribuiu para derrubar as barreiras e repressão que ainda persistem e constrangem tanto as mulheres. Que essas barreiras e repressões são resistentes dão provas o fato de que a autora, que demonstra tanta bravura no corpo de seu livro, não ousa escrever o título com todas as letras.
Até recentemente as fêmeas de muitas espécies eram tidas como monógamas, preferindo acasalar-se com apenas um macho. Sabe-se agora que tal teoria está errada – as fêmeas da maioria das espécies são polígamas, preferindo acasalar-se com vários machos. Na realidade, a idéia da fêmea monógama era uma noção científica decorrente de uma ideologia, não dos fatos. A ideologia, neste caso, era a idéia ultrapassada que as fêmeas conseguiam e não deveria sentir desejo e prazer sexuais, como os machos podiam e conseguiam. A pesquisadora observa que para entender as teorias científicas deve-se examinar a cultura que as cria.
E ela analisou como a ciência, a medicina e a anatomia ocidentais têm visto a vagina. Doutrinas antigas e arbitrárias determinaram que o homem era a medida da mulher, e que o pênis dele era o padrão de medida da genitália dela. O resultado dessa lógica foi que os anatomistas do Renascimento viram-se proclamando que a vagina era um pênis subdesenvolvido e virado do avesso, que os ovários eram testículos, o útero era um escroto e o clitóris também era um pênis. E fizeram isso a despeito de uma notável evidência em contrário, porque tinham que repetir o que as autoridades de plantão lhes mandavam dizer.
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