Lucas é mudo, mas sempre consegue passar o seu recado. Caio é cadeirante e sabe lidar muito bem com a trajetória da vida. Rafael é deficiente visual que gosta de filosofar sobre tudo o que ainda não viu, mas enxerga o mundo de uma perspectiva lúcida. Mateus é autista e consegue entender o que está em sua volta. Leandro, o melhor amigo de Lucas, é um garoto judeu super ativo e cheio de imaginação. Essa é uma turminha muito especial. Faz parte da tirinha Fala Menino!, do cartunista e escritor baiano, Luis Augusto Gouveia. Os personagens possuem necessidades especiais, mas os traços de Luis Augusto não caem no arquétipo da cartilha contra o preconceito. Mesmo com limitações físicas, as crianças não permitem que isso impeçam de realizar as ações típicas da infância como as brincadeiras, as paqueras, os sonhos. Tudo isso com uma dose de humor e otimismo. Uma turminha que tem que lidar com os dilemas da infância, dialogando com o mundo dos adultos de um jeito muito especial.
Desde 1996 que Luis vem publicando suas tiras diárias no jornal A Tarde. Ao colocar luz sobre a infância e juventude da garotada, Luis Augusto desmistifica e dá dignidade ao personagem. Em termos de inclusão e exclusão, Augusto mostra como as crianças ouvem o som do mundo, sente os perfumes, o calor do toque, do abraço amigo e sugere a inclusão, onde todos se tratam de igual para igual. Se seus personagens possuem limitação visual e/ou auditiva, são crianças felizes e com capacidade de sentir o mundo. O objetivo é falar sobre diferenças e deficiências. As crianças não nascem com preconceito, mas vão adquirindo no decorrer da vida, então o artista trabalhar na infância para ter uma sociedade melhor.
DIVERSIDADE - Assim é o trabalho criativo de Luis Augusto, discute o relacionamento do mundo adulto com a infância apresentando a diversidade do universo infantil e contribuindo para que a criança tenha voz atuante na sociedade. Reflexivo, contemplativo e incisivo.“Com a honestidade da perspectiva infantil, falar da criança como o ser inteligente e crítico que é, capaz de discutir o comportamento adulto. E junto com o Lucas, discutir o relacionamento do mundo adulto com a infância, talvez o único momento da vida em que somos quem nascemos para ser, sem tantas máscaras sociais, sem tantos preconceitos”, diz o autor. O Fala Menino! nos conta de diferenças físicas ou sociais, de superação de limites, de inclusão, de responsabilidade social com a naturalidade das lições que apenas a infância sabe dar.
Os desenhos de Luis Augusto Gouveia foram premiados pela UNICEF, inclusive no Prêmio Ibero Americano de Comunicação pelos Direitos da Infância. A tira está sendo publicada no jornal A Tarde, além de vários livros editados e uma série de desenhos animados de 15 capítulos (de 45 segundos cada) que ficou no ar na programação das emissoras baianas.
O que chama atenção nos quadrinhos de Luis Augusto é sua perspectiva nova em termos de linguagem, conteúdo e forma. Refletir e expressar o seu tempo é essencial para o desenhista. Ter consciência de sua época. Como expressar seu mundo, de que formas dispõe para a execução e que posições tomar frente à realidade do momento. Essas são perguntas que muitos desenhistas se fazem a todo instante, uns mais outros menos. Uma obra de arte significa sempre uma tomada de posição do artista perante a vida. Aqueles que procuram uma arte de consumo fácil, de puro ócio, dificilmente seu trabalho resistirá ao passar do tempo. O de Luis Augusto vai atravessar gerações, porque além de falar ao coração, chega junto na consciência, o que é essencial. Promove dignidade e emancipação das pessoas especiais.
Antes de se formar em Arquitetura e Urbanismo, em 1994, já trabalhava com arte educação em escolas da Bahia. Trabalhou com Ziraldo fazendo histórias para a revista O Menino Maluquinho, da Editora Abril. Em 1989, publicou a tira Liu e o Mágico do Sobaco, lançou o fanzine Calouro humano. A seguir produziu uma série de quadrinização de músicas da MPB publicada em forma de revista, a MPB em HQ. Em 1995, recebeu Menção Honrosa no 1º Concurso Nacional de Histórias em Quadrinhos da Academia Brasileira de Artes, em São Paulo, com a história Hamlet na Varanda. Fez ilustrações em Nova York, desenho animado em São Paulo (participou da animação do clip da música “Tieta”, de Caetano Veloso), e tem trabalhos publicados em todo o Brasil. Da sua experiência como Arte-Educador nasceu o “Fala Menino”, obra pela qual ganhou o Prêmio HQ Mix de Melhor Álbum Infantil (1997) e Menção Honrosa na Categoria Trabalhos Gráficos, outorgado pela Unicef (1999). O antigo estudante de Arquitetura seguiu de vez sua vocação para desenhista.
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