O tempo está na base dos problemas sociais. Quem não acreditar nisso basta ler o livro do economista Eduardo Giannetti (O Valor do Amanhã). Para Giannetti, a guerra contra o tempo faz o ser humano estabelecer suas prioridades e buscar sempre o prazer imediato, ignorando qualquer noção racional de planejamento ou aposta positiva na realização de seus sonhos no futuro. A questão da violência urbana (“quem tem fome tem pressa”) e política (a necessidade de enriquecimento rápido resultando na corrupção) estão relacionadas com o tempo.
O livro de Giannetti destrincha o porquê de o homem aceitar o pagamento de juros – “usufruir agora, pagar depois” e como “antecipar custa, retardar rende”, pagamos pela diminuição da espera. O que são os juros o não ser o valor que temos de pagar por não querermos esperar? Qual noção do tempo queremos ter: a da criança que não sabe esperar, a do jovem que nunca vê o futuro como previsão mas como sonho, ou a da velhice quando enxerga-se o passado como um tempo que nem demorou muito nem está tão distante e até que foi rápido e valeu a pena. Para o economista, toda a economia se reduz a “economizar tempo” e para pagarmos menos juros é melhor aprendermos a dominar o tempo.
Outro exemplo sobre a reflexão sobre o tempo é o recente filme “Flores Partidas” do cineasta Jim Jarmusch. Na fita o ator Bill Murray vive um velho rico e solitário que promove um acerto de contas com seu passado de conquistador, ao partir em busca de um filho desconhecido. Nessa busca ele reencontra três antigos amores e como lição o cineasta alerta que é melhor guardarmos os bons momentos na lembrança do que insistir em revivê-los.
Mesmo como os avanços científicos que aumentam a expectativa de vida, o homem tem cada vez mais pressa: a vida é curta, tempo é dinheiro, o tempo é o senhor da razão, dê tempo ao tempo, o tempo é o melhor remédio, tudo tem seu tempo, só o tempo vai dizer são alguns exemplos. A ideologia pós-modernista impõe a vida no tempo real, no aqui e no agora. Como afirmou o sociólogo francês Gilles Lipovetsky, o prazer individual e imediato é o único bem possível. A sociedade americana de hoje com a sua libido consumista é um exemplo dos dias atuais. O consumidor tem pressa seja no atendimento, na troca, na garantia de satisfação do desejo manifestado na compra. E os shoppings são os lugares onde todos os desejos podem ser atendidos, inclusive, a fome de fast-food.
Gilles Lipovetsky, teórico do novo individualismo e intérprete da era moderna, em seu livro Os Tempos Hipermodernos, mantém sua linha de provocação e debruça-se novamente sobre o homem contemporâneo para atestar nossa transição da fase pós-moderna para a hipermodernidade. Escrito com a colaboração de Sébastien Charles, explica como a globalização fortaleceu o individualismo, o mercado e o avanço técnico-científico. A obra de Lipovetsky é profundamente marcada pela interpretação da modernidade. Em L´Ere du vide (1983), ele define o que chamou de "paradigma individualista" – um homem preocupado em se diferenciar na multidão, realizar seus desejos imediatamente, viver já, aqui e agora, sem se deixar seduzir por ideologias políticas ou ídolos. De lá par cá, o autor não parou de explorar as múltiplas facetas do homem contemporâneo: a ditadura da moda, a metamorfose da ética, a nova economia dos sexos, mas sobretudo a explosão do consumo de luxo para atender a um indivíduo hedonista que surgiu com as frustrações dos tempos modernos. Lipovetsky foi um dos principais responsáveis pela popularização do conceito de pós-modernidade e, hoje, é um dos defensores da democracia liberal.
Neste livro, Lipovetsky dá continuidade a este seu itinerário intelectual tão bem delineado por suas obras anteriores. No Brasil, foram editados O império do efêmero (Companhia das Letras, 1989), A terceira mulher (Companhia das Letras, 2000) e Metamorfoses da cultura liberal (Editora Sulina, 2004). Ele argumenta que, desde os anos 50, o mundo vive uma intensificação jamais vista do tripé que sempre caracterizou a modernidade: o mercado, o indivíduo e a escalada técnico-científica. A partir dos anos 80, com o avanço brutal da globalização e das novas tecnologias de comunicação, esse fenômeno – que ele batizou de hipermodernidade – adquire uma velocidade espantosa, passando a interferir diretamente sobre comportamentos e modos de vida.
Mais do que um lance de retórica, o termo hipermodernidade define a situação paradoxal da sociedade contemporânea, dividida de modo quase esquizofrênico entre a cultura do excesso e o elogio da moderação. De um lado, diz Lipovetsky, "é preciso ser mais moderno que o moderno, mais jovem que o jovem, estar mais na moda do que a própria moda"; de outro, valorizam-se "a saúde, a prevenção, o equilíbrio, o retorno da moral ou das religiões orientais".
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