Bourdieu mostra a maneira que as preferências culturais dos agentes são estruturadas – através de transmissão do capital cultural incalculado na escola e aquele herdado pela família, efetuado de maneira precoce ou através do aprendizado tardio. As práticas culturais incentivadas por essas duas instâncias distinguem aquilo que será reconhecido como gosto legítimo burguês, de classe média ou popular.
O gosto ou as preferências manifestadas através das práticas de consumo é, então, o produto dos condicionamentos associados a uma classe ou fração de classe. O gosto, dirá Bourdieu, é a aversão, é a intolerância às preferências dos outros. È percebida desta forma que a reprodução moral, ou seja, a transmissão dos valores, virtudes e competências, maneira de ver o mundo simbólico, serve de fundamento à filiação legítima de habitus distintos e desiguais, fortalecendo e intensificando a hierarquia do culturalmente aceito ou execrável, do autêntico ou do inautêntico.
A distinção desnuda e explica, ao mesmo tempo, os estudos sobre linguagens, grupos sociais, política, educação, arte ou comunicação, pois oferece uma análise do mundo social de maneira coerente e instigante. A distinção é a obra mais conhecida e mais prestigiada de Pierre Bordieu, e traz em boa parte de sua exposição as preocupações decorrentes de anos de estudos sobre a elaboração de uma teoria geral das classes sociais. Ele fez de sua vida acadêmica e intelectual uma arma política e de sua sociologia uma sociologia engajada, profundamente comprometida com a denúncia dos mecanismos de dominação em uma sociedade injusta.
Bourdieu identifica como habitus “pequeno burguês ascendente” a prática do relaxamento e a preocupação com uma alimentação light, que contrasta com o gosto popular pela agitação e comidas mais consistentes. A prática social não resulta, assim, necessariamente de uma escolha, mas de gostos (e de desgostos) profundamente enraizados no corpo. A essa lógica prática está associado um conhecimento prático, intuitivo, um “senso prático”.
Este saber prático incorporado vem alimentar um velho debate filosófico e sociológico sobre a relação entre a reflexão e a ação. A teoria da ação proposta por Bourdieu parte de uma crítica às leituras intelectualistas da ação, isto é, às visões que tendem a reduzí-la ao ponto de vista reflexivo daquele que observa, em detrimento do ponto de vista prático daquele que age.
O trabalho desse sociólogo incomodou muita gente porque ele interpretou os fenômenos sociais de maneira crítica. Na questão da formação do gosto cultural de cada um de nós, ele interpretou o jogo de poder das distinções econômicas e culturais de uma sociedade hierarquizada. Para ele o gosto cultural é produto e fruto de um processo educativo, ambientado na família e na escola e não fruto de uma sensibilidade inata dos agentes sociais.
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