22 novembro 2007

Entre música e poesia, harmonia (1)

Desde os magníficos trechos poéticos da Bíblia, do lirismo erótico de Safo, dos textos gregos e latinos, a poesia sempre se fez presente. E a música era instrumental. Durante um longo período, a música ocidental foi homofônica. Existia uma única linha melódica ou voz, sendo que o restante da música era composto de harmonia que sustentava essa linha melódica. Geralmente, a melodia principal era em um tom mais elevado e identificava a peça. A música religiosa do século IV não necessitava de um acompanhamento musical. Uma única voz cantava a melodia simples em latim. No século VI, o Papa Gregório I decidiu governar também a feitura das músicas. Como resultado, surgiu o canto gregoriano, que era cantado em uníssono.

Foi na Idade Média que houve a descoberta que os vários sons podiam ser feitos ao mesmo tempo, sem que um cancelasse o outro, ou em resultar em mero ruído, e, assim, nasceu a polifonia Coincidiu que a polifonia surgiu com a construção das grandes catedrais góticas e o nascimento da harmonia, que culminaram com a Renascença e o início das ciências modernas e da matemática. O interior de uma antiga igreja de arquitetura romana com teto alto e em volutas, paredes paralelas e uma longa arcada, espaço ideal para as procissões, mas também para as reverberações do canto gregoriano. Já no interior de uma catedral gótica, com seus ângulos, corredores, estátuas, escadarias, nichos e complexas fugas em pedra, um canto gregoriano seria partido, fragmentado.
Na Idade Média os trovadores surgiram para cantar o amor cortês. Eram cantigas com letras resistentes à leitura mais sensível e rigorosa. Depois a música colou-se à pele das palavras numa relação intensa e apaixonada. É quando acontece a síntese entre música e poesia. Muitos versos soam banais quando lidos sem acompanhamento musical. Mas quando aparece junto ao suporte sonoro, emociona. Faça um este com as músicas que você costuma ouvir com freqüência, retire o suporte musical e tente ler a composição em voz alta. Muitas dessas composições não convencem sem seu lado musical.

Mas quando a pele da palavra se encaixa nos acordes dos sons e decifra seus códigos, se aprofunda nos sentimentos humanos e nos muitos compassos da música, o resultado é exitoso. Paixão para os ouvidos, carícias para a mente. E nessa relação intensa onde a voz ilumina a corda instrumental em que se equilibra a vida, uma vida musical do universo estético equilibrado e não apenas um simulacro da expressão artística que se ouve nos atuais ritmos populares (pagode, axé...)

Música e letra de qualidade acaricia a pele de verdade, invade todos os infindáveis poros, por cima ou por baixo dos acordes. Busca com avidez os segredos da língua, uma menina ao som do seu bel prazer, deixando feliz todo e qualquer ser. Afinal, a palavra pele é uma tinta que não se expele.

“A nossa poesia é uma só/eu não vejo razão para separar/todo o conhecimento que está cá/foi trazido dentro de um só mocó/e ao chegar aqui abriram o nó/e foi como se ela saísse do ovo/a poesia recebeu sangue novo/elementos deveras salutares/os nomes dos poetas populares/deveriam estar na boca do povo//Os livros que vieram para cá/O Lunário e a Missão Abreviada/A donzela Teodora e a fábula/obrigaram o sertão a estudar/de repente começaram a rimar/a criar um sistema todo novo/o diabo deixou de ser um estorvo/e o boi ocupou outros lugares/os nomes dos poetas populares/deveriam estar na boca do povo//No contexto de uma sala de aula/não estarem esses nomes me dá pena/a escola devia ensinar/pro aluno não se achar um bobo/sem saber que os nomes eu louvo/cão vates de muita qualidades./O aluno devia bater palma/saber de cada um o nome todo/se sentir satisfeito e orgulhoso/e falar deles para os de menor idade/os nomes dos poetas populares” (Poesia de Antonio Vieira)

Hoje, a partir das 18h na Livraria Civilização Brasileira do Shoppping Barra (2º piso), Ruy Espinheira Filho estará autografando seu livro "Um Rio Corre na Lua".

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